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Jurisprudência
Sumário
  1. Está vedado ao tribunal de revista a sindicação do acórdão da Relação quanto ao modo como se julgou a impugnação da matéria de facto sempre que se imputam erros e/ou omissões na apreciação crítica de provas produzidas e valoradas em regime de prova livre, fundada no âmbito e na esfera de intervenção e dos poderes de cognição do erro de facto proporcionados amplamente pelo art. 662º, 1, do CPC – assim dispõe o art. 662º, 4, do CPC –, não estando em causa, nesse âmbito, prova vinculada ou prova com força legalmente vinculativa (art. 674º, 3, 2.ª parte, 682º, 2, CPC).
  2. O regime legal do contrato de empreitada permite que o pagamento do preço seja definido em função de «uso em contrário» ao pagamento no acto de aceitação da obra. Para este efeito, os “usos” correspondem aos costumes de facto observados por certas pessoas em certo domínio negocial-económico, independentemente da convicção de que, com essa observância, se obedece a uma certa disciplina jurídica, desde que fundados na devida remissão/habilitação legal (nos termos do art. 3º, 1, do CCiv. «Os usos que não forem contrários aos princípios da boa fé são juridicamente atendíveis quando a lei o determine.»). Assumem um carácter normativo ou vinculante, assente no princípio da confiança, com uma função equivalente ao princípio da autonomia privada. Em função desse conjunto negocial e subjectivo, são vistos como verdadeiras cláusulas tácitas, que serão denunciados, na hipótese, pelas características da empreitada e/ou deduzidos dos comportamentos concludentes das partes (art. 217º, 1, CCiv.), no sentido de, não obstante o contrato de empreitada não ser tipicamente um contrato de prestação duradoura, ser usualmente fraccionado o pagamento do preço devido pelo dono da obra, em função da natureza prolongada da sua execução e do parcelamento dos trabalhos feitos e interpelados para pagamento pelo empreiteiro.
  3. Não havendo fundamento lícito para a resolução legal (nos termos dos arts. 432º, 1, 801º, 2, 808º, 1, do CCiv.), uma vez estando a parte (dono da obra) que a declara em mora quanto ao cumprimento parcial do preço correspondente às prestações de trabalho feito pela outra parte em contrato de empreitada (pago em parcelas de acordo com o “uso” admitido nos contratos de empreitada), e tendo esta parte (empreiteiro) invocado previamente a falta de pagamento como “excepção de não cumprimento” à luz do art. 428º, 1, do CCiv., não podem, em face de uma declaração ineficaz por ilícita, ser desencadeados os efeitos desvinculativos – retroactivos, restitutórios e liberatórios – da resolução (tal como previstos nos arts. 433º e ss do CCiv. e na medida admitida pelos arts. 801º, 2, e 434º, 2, do CCiv) para recuperar as prestações sinalagmáticas e correspectivas, já executadas (como preço) antes da declaração resolutiva e exigíveis em função dessa natureza, nem para a exoneração do pagamento, restante e em falta, das prestações executadas pela contraparte empreiteira.
Decisão Texto Integral