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Jurisprudência
N.º de Processo:
106/15.1JBLSB.L2.S1
www.dgsi.pt Fonte: STJ (DGSI)
Data:
20/12/2023
Meio Processual:
Jurisprudência:
Votação:
Relator:
Sumário

I. A apreciação dos antecedentes criminais do arguido, vertidos no seu certificado de registo criminal, na ponderação da aplicação de uma pena (única ou singular), nunca pode ser considerada como algo fora do objecto do processo, como algo subtraído ao conhecimento do julgador e que, sendo conhecido, se traduz em excesso de pronúncia, determinando a nulidade da sentença.

II. Verificando-se a necessidade de proceder a um cúmulo jurídico de penas total ou parcialmente englobadas em cúmulos anteriores, elaborado novo cúmulo jurídico e, por isso, previamente “desfeito” os anteriores, as penas parcelares que os integravam retomam autonomia e, assim, os limites mínimo e máximo da pena única abstractamente aplicável são definidos pela pena parcelar mais elevada e pela soma de todas as penas parcelares, respectivamente.

Decisão Texto Integral

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:


I. 1. No Proc. comum colectivo nº 106/15.1JBLSB, do Juízo central criminal de ..., foi proferido – em 5/6/2023 – acórdão no qual se procedeu ao cúmulo jurídico de várias penas parcelares, tendo o arguido AA, com os demais sinais dos autos, sido condenado na pena única de 6 anos e 9 meses de prisão.

2. Inconformado, recorreu o arguido para o Tribunal da Relação de Lisboa, suscitando a nulidade do acórdão recorrido por excesso de pronúncia e, de outro lado, pugnando pela redução da pena única para medida não superior a 5 anos e 6 meses de prisão.

3. Em decisão sumária, a Exmª Desembargadora relatora considerou incompetente o Tribunal da Relação de Lisboa para o conhecimento deste recurso, porquanto o arguido foi condenado em pena superior a 5 anos de prisão e o recurso visa exclusivamente questões de direito, razão pela qual entendeu, bem, ser este Supremo Tribunal de Justiça o competente para o conhecimento do mesmo.

4. O recorrente extrai da sua motivação as seguintes conclusões (transcritas):

“1. Do excesso de pronúncia – violação do disposto no art.º 379.º n.º 1 alínea c) do CPP: O douto acórdão, para além de mencionar as duas condenações segundo o douto aresto ora em concurso e passíveis do respectivo cúmulo jurídico faz ainda referência a penas muito antigas sofridas pelo arguido, algumas por factos praticados há mais de dez e outras penas suspensas todas já consideradas extintas pelo cumprimento,- Como consta do recorrido acórdão.

2. Mas as penas suspensas que já foram consideradas extintas pelo cumprimento, sem revogação da mesma, não poderiam ou não deveriam ser atendidas pelo Tribunal, uma vez que nenhuma relevância devem assumir – salvo melhor opinião – para a formulação de uma decisão cumulatória restrita às duas últimas condenações sofridas pelo recorrente, num passado mais recente.

3. Encontrando-se averbadas no CRC, não deveria o douto Tribunal socorrer-se dessas mesmas decisões condenatórias como argumento “de peso” dada a sua não particular relevância.

4. Neste “interin” se entende que existirá uma nulidade de excesso de pronúncia. Repare-se que o acórdão em termos de análise dos efeitos da prevenção geral, apenas considera que se mostram “acentuadas as necessidades de prevenção geral, considerando o grande alarme social que os crimes em análise provocam” – e “a frequência com que são cometidos estes ilícitos jurídico-penais”, não reportando essas considerações às apontadas penas mais antigas,

5. Ao pronunciar-se sobre essa matéria – condenação do recorrente em penas muito antigas e de natureza bem diferente: penas de prisão suspensas na sua execução e penas de multa, todas elas já extintas – o douto acórdão recorrido cometeu a nulidade de excesso de pronúncia cominada no art.º 379.º alínea c) do CPP.

6. Da medida da pena cumulatória – violação dos art.º 71.º 1 e 2, 77.º e 78º do C.P.P: Quanto ao aspecto da personalidade do recorrente no seu todo o acórdão recorrido considera, entre outros itens, que o arguido tem tido bom comportamento em meio prisional, estando a aguardar pela sua integração ou em ambiente laboral ou escolar, o que só não aconteceu por razões alheias á sua vontade.

7. Ainda no entendimento do recorrente, a pena máxima aplicável em sede de formulação do necessário cúmulo jurídico, não poderia exceder – e com o raciocínio deduzido anteriormente – 6 anos e nove meses de prisão.

8. Por isso, numa formulação mecânica e material (não autorizada já ou não recomendada já pelo nosso Direito Penal), a soma aritmética das duas penas cumuláveis seria de 6 anos de prisão.

9. Entende, por isso, o recorrente que o cúmulo a efectuar se deveria situar abaixo da pena aplicada, ou seja, não excedendo o patamar de 5 anos de prisão.

10. Já que o douto acórdão não considerou provado a existência quer de um comportamento de delinquente “por tendência” quer a verificação de uma personalidade considerada já como integrante de uma verdadeira “carreira criminosa.

11. Sendo que a conclusão genérica de que o arguido demonstraria uma relativa insensibilidade do arguido perante o sistema judicial, ou uma persistente indiferença pelo respeito por bens jurídicos pessoais, patrimoniais e pelos alicerces da vida em sociedade entre outros, não pode justificar só por si a aplicação de uma pena cumulatória de 6 anos e nove meses de prisão.

12, Uma vez que o arguido encontra-se em reclusão pela primeira vez, - à ordem do presente processo – a que se refere a condenação imposta de 4 anos e seis meses de prisão. E apesar de preso pela segunda vez o seu comportamento prisional tem sido bom.

13. Em favor do arguido – como ainda assim se salienta na recorrida decisão – que o mesmo revela capacidade para o trabalho e em poder acompanhar os seus filhos, bem como goza de apoio familiar da sua família alargada.

14. Por último deve considerar-se que o arguido não se dedicou a “uma carreira criminosa” revelando os ilícitos praticados e a sua natureza – uma certa “pluriocasionalidade”, que não radica já numa “personalidade desviante”.

15. Parafraseando, com a devida vénia, um excerto do douto Acórdão deste Venerando STJ proferido em 15.11.2017 no processo 336/11.5GALSD, que com a devida vénia se transcreve:

“Na avaliação da personalidade -unitária – do agente, importa sobretudo, verificar se o conjunto dos factos é reconduzível a uma tendência (ou eventualmente mesmo a uma “carreira criminosa”), ou tão-só a uma pluriocasionalidade, que não radica na personalidade, Só no primeiro caso, não já no segundo, será cabido atribuir à pluralidade de crimes, um efeito agravante, dentro da moldura penal conjunta.”

16. Não tendo invocado o douto acórdão recorrido que a situação do recorrente consubstaviava uma tendência ou mesmo “uma carreira criminosa”, antes, pelo contrário reconhecendo a dimensão das atenuantes verificadas, nelas imperando o arrependimento e o juízo auto-crítico da conduta ilícita, sempre a pena de 6 anos e 9 meses de prisão imposta em sede cumulatória se mostraria excessiva. Foram violados, por erro de interpretação os art.º 71.º 1 e 2 e 78.º do CPP.

17. Por todas estas razões a pena cumulatória a encontrar entre estes dois processos “supra” referidos, englobando as penas cumulatórias anteriores de 4anos e seis meses e 9 anos de prisão, não deveria exceder os 5 anos de prisão ou no limite 5 anos e seis meses de prisão”.

5. Respondeu o Digno Magistrado do MºPº na 1ª instância, pugnando pelo não provimento do recurso e assim concluindo:

“1. O arguido recorre do acórdão cumulatório proferido em 05.06.2023, na qual se operou o cúmulo jurídico das penas aplicadas nos presentes autos e no processo n.º 291/09.1... e foi aplicada a pena única de 6 (seis) anos e 9 (nove) meses de prisão, alegando, em síntese, que considera excessiva a medida da pena única.

2.O Recorrente alega que o acórdão recorrido padece excesso de pronúncia, previsto na alínea c), do n.º 1, do artigo 379.º, do Código de Processo Penal, pois entende o Recorrente que o acórdão recorrido não podia fazer referência a penas antigas sofridas pelo arguido, já extintas.

3. Ora, do artigo 11.º da Lei n.º 37/2015 de 5/5 decorre que “o cancelamento do registo criminal decorre de uma imposição legal e tem lugar sempre que o arguido não volte a delinquir, pois em tal circunstância o arguido tem o direito a ser reabilitado e o Tribunal não pode ter em conta, para quaisquer efeitos, tais condenações, havendo uma verdadeira proibição de valoração de prova.”

4. As decisões inscritas no registo criminal só devem ser canceladas, cessando a sua vigência no registo criminal, decorrido o prazo previsto de cancelamento e desde que, entretanto, não tenha ocorrido nova condenação por crime de qualquer natureza.

5. É bom de ver que não é o que sucede no caso em apreciação. Com efeito, analisando o CRC do arguido, facilmente se depreende que após a data de extinção das penas ali inscritas, ao mesmo sobrevieram novas condenações, e, por isso, não se encontram preenchidos os requisitos de que depende o cancelamento do registo criminal.

6. Veja-se, nesta esteira, o que ficou exarado no Ac. do TRL de 03.11.2021 (disponível em www.dgsi.pt): “O CRC do arguido encontra-se corretamente ativo, não existindo qualquer motivo para a sua reabilitação, por não estarem reunidos, simultaneamente, os dois critérios necessários, decurso do tempo sobre a data da extinção da pena e inexistência de novas condenações, pelo que pode ser valorado na sua totalidade.”

7. Há, pois, que concluir que não há quaisquer condenações que constem do CRC do arguido que não devessem constar, por não estarem reunidos, simultaneamente, os dois critérios necessários: decurso do tempo sobre a data da extinção da pena e inexistência de novas condenações, pelo que bem andou o Tribunal a quo ao valorar o Certificado do Registo Criminal na sua totalidade.

8. Assim, é forçoso concluir, que ao contrário do alegado pelo arguido, não padece o acórdão recorrido do arguido vício. Aliás, a não alusão a elementos considerada excesso pelo Recorrente, essa é que poderia redundar em omissão de pronúncia. Designadamente, o acórdão recorrido, ao referir-se às anteriores condenações do recorrente, não vai além da sua função, mormente na análise da conexão dos factos cometidos com a personalidade que neles se projeta, pelo que não padece, assim, o acórdão recorrido de qualquer vício de excesso de pronúncia, a que alude o artigo 379.º, n.º 1, al. c), do CPP.

Por outro lado,

9. Refere o Recorrente que a moldura abstracta encontrada pelo Tribunal a quo não está correcta, pois, “a pena máxima aplicável em sede de formulação do necessário cúmulo jurídico, não poderia exceder – e com o raciocínio deduzido anteriormente – 6 anos e nove meses de prisão”

Por isso, numa formulação mecânica e material (não autorizada já ou não recomendada já pelo nosso Direito Penal), a soma aritmética das duas penas cumuláveis seria de 6 anos de prisão.”

10. Entendemos não assistir razão ao Recorrente, porquanto, como bem refere o Tribunal a quo, de acordo com o n.º 2 do artigo 77.º, do Código Penal, tal moldura terá, como limite máximo, a soma das penas concretamente aplicadas aos vários crimes em concurso e, como limite mínimo, a mais elevada das penas parcelares a cumular.

11. Havendo anterior cúmulo jurídico, há que ser desfeito. Nesse sentido veja-se, a título exemplificativo, o que ficou exarado no Ac. do STJ de 15.07.2020: “V - As penas conjuntas aplicadas em anteriores cúmulos jurídicos de penas perdem a sua subsistência, devendo desaparecer, perante a necessidade de uma nova recomposição de penas já que na reformulação de um cúmulo jurídico, as penas a considerar são sempre as penas parcelares, não as penas conjuntas anteriormente fixadas.”

12. Assim, e por referência às penas parcelares concretamente aplicadas ao arguido nos presentes autos e no processo n.º291/09.1... (2 anos e 3 meses; 4 anos; 12 meses e 2 anos e 6 meses), é bom de ver que a moldura abstracta terá como limite mínimo 4 (quatro anos de prisão) e como limite máximo 9 (nove) e 9 (nove) meses de prisão, atento o disposto no n.º 2 do artigo 77.º, do Código Penal, conforme bem decidiu o Tribunal a quo.

Por outro lado,

13. Alega o Recorrente ser excessiva a pena de prisão de 6 anos e 9 meses de prisão imposta, porquanto, como refere, “Não tendo invocado o douto acórdão recorrido que a situação do recorrente consubstanciava uma tendência ou mesmo “uma carreira criminosa”, antes, pelo contrário reconhecendo a dimensão das atenuantes verificadas, nelas imperando o arrependimento e o juízo auto-crítico da conduta ilícita”.

14. Na concretização do disposto no n.º 1, in fine, do artigo 77.º, do Código Penal, na medida da pena, no que à punição do concurso concerne, são considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente, como, aliás, tem sido pacífico na jurisprudência.

15. Assim, na formação da pena conjunta importa ter uma visão de conjunto, importa ter em conta a eventual conexão dos factos entre si e a relação desse trecho da vida do arguido com a sua personalidade, obtendo-se uma valoração completa do arguido como pessoa e do arguido como sujeito das diversas penas parcelares, sem dispensar, porém, porque de uma nova sentença se trata, as necessárias considerações quanto às exigências de prevenção geral e especial, tendo sempre a nova pena conjunta, como limite, a medida da culpa do condenado.

16. In casu, dentro da moldura abstracta de 4 (quatro) anos a 9 (nove) anos e 9 meses, o Tribunal a quo aplicou uma pena de 6 (seis) anos e 9 (nove) meses, pena essa que se considera justa e adequada, atendendo à ponderação global dos factos praticados e da personalidade do arguido.

17. Atendendo ao passado criminal do arguido, plasmado no seu Certificado do Registo Criminal, (que, ao contrário do que pretende o Recorrente, é atendível e para ser considerado para aferir da sua personalidade), e bem assim, na factualidade dada como provada na douta sentença recorrida, urge concluir que o conjunto dos factos em apreciação é reconduzível a uma tendência criminosa, sendo imperioso atribuir à pluralidade de crimes um efeito agravante dentro da moldura penal conjunta.

18. O Tribunal a quo realizou, pois, uma avaliação da personalidade do arguido e um exame crítico de ponderação conjunta sobre a interligação entre os factos e a personalidade do condenado, de molde a concluir que o conjunto dos factos delituosos em concurso são expressão de uma inclinação criminosa (e não apenas delitos ocasionais sem relação entre si), que radica numa personalidade criminógena e avessa ao Direito.

19. Urge realçar, como bem fez o acórdão recorrido, que mesmo ter cumprido uma pena de prisão efectiva, o arguido voltou a delinquir, ou seja, tal condenação não surtiu qualquer efeito ressocializador.

20. Por outro lado, não se olvide, igualmente, o elevado grau de ilicitude dos factos praticados pelo arguido e as elevadíssimas exigências de prevenção geral que cumpre acautelar in casu, atendendo aos bens jurídicos violados.

21. E há, ainda, que salientar que o arguido cometeu crimes de diversa natureza, atentando, pois, contra diversos tipos de bens jurídicos e nestes autos estão em causa crimes contra as pessoas, o que é, por si só, demonstrativo do desvalor das suas condutas.

22. Apreciando os factos, fica evidenciado que o arguido revela grande propensão para o cometimento de crimes, não conseguindo manter uma conduta conforme os valores fundamentais da vida em comunidade, registando vários crimes praticados ao longo dos anos, o que revela grande persistência no seu desígnio criminoso.

23. De facto, apenas milita a favor do arguido a actual situação de bom comportamento no estabelecimento prisional.

24. Por todo o exposto, resta concluir que o Tribunal a quo ponderou todas as circunstâncias atinentes à globalidade e gravidade dos factos, aos antecedentes criminais e à personalidade do arguido, fixando correctamente a pena única, por ser aquela que se mostra justa, adequada e proporcional às necessidades de prevenção geral e de prevenção especial que no caso em apreço se impõem”.

II. 1. Neste Supremo Tribunal de Justiça, o Exmº Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer, pugnando pelo provimento parcial do recurso:

«4.1. Enquadramento jurídico e análise:

4.1.1. Quanto à nulidade do acórdão por excesso de pronúncia:

Sustenta o recorrente que o acórdão recorrido faz referência a penas muito antigas sofridas pelo arguido, algumas por factos praticados há mais de dez anos e outras penas suspensas todas já consideradas extintas pelo cumprimento, as quais não deveriam ter sido atendidas pelo tribunal a quo, por não terem relevância para a decisão cumulatória, ainda que se encontrassem averbadas no seu CRC, assinalando o recorrente que o acórdão recorrido se socorreu delas como “argumento de peso”.

Está pois alegado um excesso de pronúncia para fundamentar a invocação de nulidade, que o recorrente reconduz ao disposto no artigo 379.º, n.º 1, alínea c), do Código de Processo Penal, que dispõe ser nula “… a sentença que conheça de questões de que não poderia tomar conhecimento”.

Vejamos.

Em causa está um acórdão cumulatório cujos pressupostos ou questões a analisar e decidir se centralizam na aplicação de uma pena única ou conjunta quando se constate um concurso de crimes praticados antes do trânsito em julgado da condenação por qualquer deles – cf. artigo 78.º, do Código Penal.

Portanto, as questões a decidir têm de ver, primeiro, com a verificação do pressuposto do concurso, depois com a punição do concurso com uma pena conjunta, a qual é determinada no âmbito de uma moldura abstrata cujo limite máximo resulta da soma das penas concretas aplicadas a cada crime, mas cujo quantum concreto resulta da ponderação conjunta ou global dos factos relativos aos crimes em concurso e da personalidade do agente – cf. artigos 77.º e 78.º do Código Penal – “Quando alguém tiver praticado vários crimes antes de transitar em julgado a condenação por qualquer deles é condenado numa pena única. Na medida da pena são considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente”, sendo certo que a pena aplicável tem como limite máximo a soma das penas parcelares e como limite mínimo a mais elevada das penas concretamente aplicadas.”.

Afigura–se–nos que a invocação de excesso de pronúncia é em si mesma excessiva, já que não se trata de questão “a se” que o tribunal a quo tivesse apreciado indevidamente, quer como pressuposto, quer como fator ponderativo da pena conjunta aplicada (factos e personalidade do agente).

Mas, antes de acentuar essa conclusão, importa saber se o CRC poderia ter sido valorado, ainda que incidentalmente, para a determinação da medida da pena conjunta.

Decorre da leitura do artigo 11.º da Lei n.º 37/2015, de 5–5, que o cancelamento do registo criminal é uma imposição legal desde que tenham decorrido determinados prazos sobre a data da extinção das penas e desde que o arguido não volte a delinquir, circunstâncias de que decorre a reabilitação do arguido e a proibição de o tribunal valorar os antecedentes criminais que cessaram a sua vigência 1.

A informação registada no CRC permanece pelo prazo que a lei estabelece e conta–se a partir da data da extinção da pena aplicada. Assim, o registo da condenação por crime contra a liberdade e autodeterminação sexual é de 25 anos (lei n.º 113/2009, de 17–9); a condenação por outro crime em pena de prisão superior a 8 anos é de 10 anos; a condenação por outro crime em pena de prisão entre 5 e 8 anos é de 7 anos; a condenação por outro crime em pena de prisão inferior a 5 anos, ou em pena de multa principal é de 5 anos; a condenação por outro crime em pena substitutiva da pena principal é de 5 anos, nas decisões de dispensa de pena ou admoestação é também de 5 anos (lei n.º 37/2015, de 5–5); interrompendo–se esses prazos se sobrevier nova condenação por crime no seu decurso.

Ora, além de o arguido não invocar qualquer valoração ilegal do seu CRC por eventual cancelamento das decisões que aplicaram penas registadas – caso em que não poderiam ser valoradas –, facto é que as condenações consecutivas aí registadas, com intervalos de 1, 2 ou mesmo 5 anos, não implicariam a cessação da sua vigência – cf. artigo 11.º da Lei 37/2015, de 5–5 – e não poderiam ter–se por canceladas – mesmo quando não averbado esse cancelamento e como efeito ipso facto desde a extinção –, como defende corretamente o Ministério Público em 1.ª instância.

Na verdade, a terem–se as coisas assim corretamente formuladas, nada impedia o tribunal a quo de valorar os registos constantes do seu CRC, fossem relativos a penas cumpridas ou não, desde que essa inscrição se considerasse ativa, não extinta e não cancelada, pelo que o aproveitamento judicial da informação contida no CRC, não sendo ilegal, não se pronuncia nem sobre facto inexistente, nem sobre facto que não devesse entrar na ponderação feita quanto à pena conjunta e concreta.

Não só por esta via deve improceder a invocada nulidade, como também não se pode considerar que a referência ao CRC do arguido, observada a legalidade da sua eventual relevância ponderativa na medida da pena conjunta, corresponda a uma pronúncia sobre questão que o tribunal tivesse conhecido indevidamente, por excesso.

O CRC é documento autêntico que certifica o registo das decisões judiciais que importa que nele constem, sendo documento que deve instruir os autos – artigos 274.º, 295.º e 369.º, n.º 1, do Código de Processo Penal – e que serve de informação para apreciar a personalidade do agente na ponderação da conduta anterior aos factos ou a preparação para manter uma conduta lícita – cf. artigo 71.º, n.º 2 alínea e) e f), do Código de Processo Penal 2.

Portanto, não se trata de questão que esteja fora da matéria de decisão do acórdão e dos poderes de cognição do tribunal, que a ele pode aludir na fundamentação quando se trata de aferir as conexões relevantes para a enunciação da imagem conjunta dos factos e da personalidade, nos termos do artigo 77.º, n.º 1, do Código Penal e que interessam para aferir da conduta anterior ao facto, circunstância que o artigo 77.º, n.º 1, ex vi artigo 78.º, n.º 1, do Código Penal não enjeita e a que o artigo 71.º, afinal, apela.

Ora, para além das condenações em penas que se encontram em concurso superveniente – e que o acórdão necessariamente teria que considerar – as demais condenações que se mostram inscritas no CRC, por não integrarem o cúmulo jurídico realizado e a pena conjunta, não podem ser – nem são – questões a decidir, sendo só sobre estas que se deve aferir o excesso ou o defeito de pronúncia cominado com nulidade – cf. acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 16–6–2016, processo n.º 2137/15.2T8EVR.S1.

Não sendo questões sobre as quais houvesse necessidade de pronúncia, a pronúncia lícita sobre elas também não constitui qualquer excesso de que se possa acusar a decisão do tribunal a quo que, em matéria de questões a resolver, decidiu pela elaboração de cúmulo jurídico por conhecimento superveniente tendo em conta os critérios legais aplicáveis contidos no artigo 78.º, n.º 1, do Código Penal.

Assim, deve improceder a invocada nulidade.

4.1.2. Quanto à medida da pena conjunta/única de prisão resultante do cúmulo jurídico e a sua redução:

Posto isto, o recorrente começa por discordar das condições legais (pressupostos) que determinaram a realização do cúmulo jurídico das penas aplicadas nos processos com os n.ºs 106/15.1JBLSB e 291/09.1...

Porém, parte de premissas equivocadas, salvo o devido respeito.

Na verdade, o recorrente acentua uma observação, que desenvolve na motivação, quanto à medida da moldura abstrata do cúmulo (e que repete de forma menos clara nas conclusões), dizendo que “Da aplicação do Direito resulta - de acordo com a decisão recorrida, - que a pena mínima a aplicar seria de 4 anos e a máxima de 9 anos. (mas isso tendo apenas em linha de conta as medidas das penas individuais, parcelares aplicadas, o que não deve ser considerado nesta fase, uma vez que o arguido já se mostra condenado – por decisões transitadas em julgado nas apontadas “supra” duas penas cumulatórias: - Uma de 4 anos e seis meses de prisão - Outra imposta 2 anos de prisão. Assim no entendimento do recorrente, a pena máxima aplicável em sede de formulação do necessário cúmulo jurídico, não poderia exceder – e com este apontado raciocínio – 6 anos de prisão”.

Contudo, tal observação assenta num equívoco (para além de encerrar um lapso de somatório segundo as próprias premissas), pois parte do pressuposto de que a moldura do concurso superveniente atende às penas conjuntas de eventuais anteriores cúmulos.

Ora, a moldura abstrata da pena conjunta ou única em caso de concurso superveniente não é, como diz, “ficcionada” a partir de penas resultantes de anteriores cúmulos, mas antes constitui um novo cúmulo jurídico que implica que seja previamente “desfeito” o anterior ou anteriores, que incluíam as penas parcelares que o(s) integravam e que, assim, retomam autonomia; pelo que o limite mínimo da pena única abstratamente aplicável é a pena parcelar mais elevada, não a pena única encontrada no cúmulo ou cúmulos anteriores – cf. acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 16–3–2022, no processo 507/19.6PBEVR.E1.S1, relator Conselheiro Sénio Alves, entre outros acórdãos do mesmo ilustre relator, onde os termos da operação é reafirmado.

Assim, veja–se o acórdão de 6–10–2021, no processo n.º 804/18.8T9GDM–FN.S1. “II - Elaborado novo cúmulo jurídico e, por isso, previamente “desfeito” o anterior, as penas parcelares que o integravam retomam autonomia e, assim, o limite mínimo da pena única abstratamente aplicável é a pena parcelar mais elevada, não a pena única encontrada no cúmulo anterior. III - Não existe, com efeito, impedimento legal à fixação de uma pena única inferior à determinada no cúmulo anterior: IV - Porém, como se refere no ac. STJ de 23-07-2017, proc. n.º 804/10.6PBVIS.C1, «o cúmulo anterior mais elevado não deixará de ser um “ponto de referência” a ter em consideração na fixação da nova pena, embora não possa funcionar como “ponto de partida” para essa operação». E, no ac. STJ de 16-05-2019, proc. 790/10.2JAPRT.S1, com o mesmo relator do anterior (Cons. Maia Costa), acrescenta-se: «o cúmulo anterior mais elevado não deixará de ser um “ponto de referência” a ter em consideração na fixação da nova pena conjunta, na medida em que esta última deverá normalmente, pelo acréscimo de novas penas, ser superior a esse cúmulo anterior».

O critério legal (letra e ratio) acolhido no artigo 78.º, do Código Penal, e da remissão que este faz para o artigo 77.º, do Código Penal, é claramente o de que para a definição da moldura abstrata se atende às penas parcelares aplicadas nos processos onde se identifica o concurso superveniente, passando–se tudo, por via daquela remissão legal, como se de um cúmulo contemporâneo se tratasse.

Portanto, tendo em conta as penas parcelares concretamente aplicadas ao arguido nos presentes autos e no processo n.º 291/09.1... (2 anos e 3 meses; 4 anos; 12 meses e 2 anos e 6 meses), a moldura abstrata a considerar tem como limite mínimo 4 anos de prisão e como limite máximo 9 anos e 9 meses de prisão – cf. n.º 2 do artigo 77.º, do Código Penal.

Ressalvado e esclarecido o inicial equívoco, o que o recorrente mais pretende é que se atenda ao quantum da pena conjunta/única aplicada, que a lei (artigos 77.º e 78.º, n.º 1, do Código de Processo Penal) faz depender de um juízo ponderativo (ou de proporcionalidade) do conjunto dos factos e da personalidade do agente.

Será excessiva a pena conjunta/única de 6 anos e 9 meses de prisão?

Vejamos:

O cúmulo jurídico é um caso especial de determinação da pena.

A jurisprudência deste Supremo Tribunal de Justiça entende, em conformidade com a lei (artigo 77.º, do Código Penal), que a moldura do concurso de crimes – no caso é a de 4 anos de prisão a 9 anos e 9 meses de prisão – tem especificidades pela maior latitude em relação às penas parcelares dos crimes singulares, das quais é uma síntese, a que acresce nova e específica fundamentação, a par com a que assenta no disposto no artigo 71.º do Código Penal.

Importa, assim, fazer atuar uma visão de conjunto dos factos provados, identificar conexões objetivas (tipo de crimes, bens jurídicos tutelados, número e gravidade dos crimes, penas aplicadas, tempo dos crimes e entre os crimes, homogeneidade ou heterogeneidade de condutas, etc.) e subjetivas (motivação, grau de ilicitude e culpa, contexto vivencial, etc.) na sua prática, em conjunto com os demais critérios legais enunciados, que servem de quadro e de síntese das exigências de prevenção geral e especial 3.

No caso concreto, feito o crivo normativo pelo conjunto dos factos e pela personalidade do agente, dever–se–á considerar que:

- A pluralidade de crimes (quatro) ocorreu em dois períodos delimitados no tempo, os crimes de condução ilegal e de resistência e coação em 27 de março de 2009 e os crimes de rapto e de extorsão em 28 e 29 de outubro de 2015.

- Os crimes de rapto e de extorsão (situados no segundo núcleo temporal) foram executados com mais três co–autores, envolveram violência física e ameaças sobre a vítima, tendo a privação de liberdade desta durado por cerca de 19 horas; a extorsão respeitou a quantia de 2.00,00€, mas era originalmente mais arrojada;

- Os crimes de condução ilegal e de resistência e coação sobre funcionário traduziram–se numa atuação em que o recorrente dirigiu o veículo que conduzia ilegalmente em direção a um elemento da GNR para evitar a fiscalização policial, pondo–se em fuga, apesar dos disparos efetuados para o demover.

- Os eventos criminosos que ficaram sumariamente descritos são mais do que a mera pluriocasionalidade e menos que uma efetiva tendência criminosa. Pelo desvalor da ação e do resultado em causa denotam um modo de vida e de estar consistentes com comportamentos desafiadores da autoridade, perigosos, antissociais e propensos para a criminalidade, ainda para mais de natureza grave ou especialmente grave no caso do rapto e extorsão, que indiciam um quadro de escalada criminosa.

- Quanto aos antecedentes criminais tem registadas condenações por crimes de roubo, cometidos em 2005; por crimes de detenção de arma proibida e furto qualificado, em 2010; e crimes de condução perigosa e ilegal em 2008, outros de condução ilegal apenas, em 2010.

- O modo de execução e gravidade dos factos pelos quais foi condenado, ou pelo menos parte deles, acentuam culpa, exigências de socialização e efeitos necessários da pena no comportamento futuro do recorrente que, pelo menos por enquanto, parece estar a responder às expetativas do sistema formal de controlo penal.

- O quadro geral objetivo e subjetivo das imputações condenatórias reclama consideráveis exigências de prevenção especial, designadamente atinentes à prevenção da reincidência e à inversão da falta de preparação para manter conduta lícita demonstrada com particular intensidade nos núcleos temporais identificados e na natureza e gravidade dos crimes cometidos.

- Por fim, a invocação pelo recorrente do bom comportamento em ambiente prisional não é de acentuado relevo, por ser o expetável, mas que no caso parece dever ganhar reconhecimento mais avantajado inspirado nos próprios termos do acórdão condenatório.

- Na verdade, o percurso de vida do recorrente não contou com um quadro familiar de apoio adequado (abandono pela mãe; vivência difícil por falta de afeto desde a infância) e veio a adotar um percurso desviante por influência do grupo de pares, apenas concluiu o ensino básico, veio a ser institucionalizado por via das condutas desviantes, tem dois filhos, cumpriu pena de prisão em França de 2017 a 2021, demonstra hábitos de trabalho no EP, assume os factos cometidos, tem propósito e vontade de se reabilitar.

- Não sendo as circunstâncias de princípio de vida descritas fatores de justificação de condutas criminosas, também não são anódinas a ponto de não se ver nelas um contexto de dificuldades facilitador de condutas delinquentes. Têm, na verdade, impacto significativo no desenvolvimento ético, emocional, social e psicológico individual, que reduz oportunidades e capacidades (capacitações) adequadas para diferentes e melhores escolhas.

- O que nos parece ser de ponderar é que esse impacto pessoal condicionador não é insuperável, nem deve impedir permanentemente a viabilidade de um melhor futuro, que também deve inspirar a pena a aplicar, pois a sua legitimidade assenta na estrita necessidade da defesa da sociedade e dos bens jurídico–penais que estruturam a convivência comum, com limites impostos pela autonomia, dignidade e humanidade de quem é agente e vítima do crime (prevenção geral positiva e negativa e prevenção especial), e cujo sentido humanista deve ser o de ajudar também, quem “caiu”, a “levantar–se”, a corrigir caminho e a seguir em frente.

- Veja-se que o acórdão recorrido não fez a afirmação de que o recorrente revelou uma personalidade tendencialmente criminosa ou passível de ser considerada como carreira criminosa.

- Ao invés, o acórdão recorrido sopesou o seguinte: “Aplicando as considerações expendidas ao caso concreto, verifica-se que no processo n.º 106/15.1JBLSB estão em causa um crime de rapto e um crime de extorsão e no Proc. n.º 291/09.1... estão em causa um crime de condução sem habilitação legal e um crime de resistência e coação sob funcionário. São plúrimos e bem distintos os bens jurídicos protegidos, pois no processo n.º 106/15.1JBLSB estão em causa bens jurídicos que atentam com a liberdade pessoal e contra o património e no processo n.º 291/09.1... estão em causa bens jurídicos como a segurança rodoviária e contra a autoridade pública, o que evidencia que o arguido atentou contra uma pluralidade de bens jurídicos e com desrespeito por várias regras de vivência em sociedade; são factos que distam vários anos entre si, pois no processo 106/15.1JBLSB estamos perante factos praticados em Outubro de 2015, enquanto no processo n.º 291/09.1... tratam de factos praticados em Março de 2009. Mas se analisarmos os vários antecedentes criminais do arguido verifica-se que o mesmo praticou crimes durante vários anos como em 2005, 2006, 2008, 2009, 2010 e 2015 e por fim em 2017, de diversas naturezas, sendo que quando praticou os factos (extorsão e rapto) em causa no processo n.º 106/15.1JBLSB já tinha cumprido uma pena de prisão efetiva (no proc. n.º 253/08.6...), o que demonstra que a condenação anterior de prisão não surtiu suficiente efeito ressocializador, não tendo tal circunstância inibido o mesmo de delinquir novamente em 2015 (praticando factos de especial gravidade). Tendo em conta a natureza dos vários factos praticados ao longo dos anos, o mesmo evidencia uma personalidade incapaz de se reger pelos valores tutelados pelo direito. É elevado o grau de culpa do arguido, na medida em que praticou todos os crimes com dolo direto. Estamos também perante um elevado grau de ilicitude dos factos praticados pelo arguido, consubstanciado no elevado desvalor dos 4 crimes por si praticados (sendo que dois dele com recurso a violência contra pessoa – como foi o caso do crime de rapto, e no caso do crime de resistência e coação sob funcionário), sendo elevadas as exigências de prevenção geral que se fazem sentir, não só pelo alarme social que os vários crimes em apreço provocam, como também pela sua danosidade social, sendo também elevadas as necessidades de prevenção especial face ao quantum de condenações já sofridas. Porém, também se teve em consideração que os vários crimes praticados pelo arguido de 2005 até 2010, incluindo a condenação do Proc n.º 291/09.1..., ocorreram todos em data anterior à primeira condenação transitada em julgado, ou seja, foram praticados todos esses factos sem que ainda o arguido tivesse sido condenado (com trânsito em julgado) numa pena. Contudo, a imagem global transmitida pelo conjunto dos factos praticados demonstra que o arguido carece manifestamente de ressocialização, manifestando reiterado desrespeito por vários bens jurídicos, sejam de natureza pessoal com violência (v.g. traduzido pela prática do sequestro), sejam de natureza patrimonial (pela prática extorsão), bem como pela convivência social pacífica, desrespeitando militares da GNR/Autoridade Pública no exercício de funções empregando violência (pela prática da resistência e coação sob funcionário), seja atentatório da segurança rodoviária (pela prática da condução sem habilitação legal). Todavia, há que atender que no presente cúmulo jurídico estamos a considerar a prática de dois crimes ocorridos em 2009 (condução sem habilitação legal e resistência e coação sob funcionário - proc n.º 291/09.1...), quando o arguido tinha 21 anos de idade, ainda não tinha sido condenado em nenhuma pena e já decorreram 14 anos, e que, entretanto, o arguido está privado da liberdade desde 2017 (em França) até à presente data, sendo que estamos em crer que o período de reclusão lhe está a servir para refletir quanto aos seus comportamentos desviantes. É certo que o arguido posterior à condenação no Proc n.º 106/15.1JBLSB não praticou mais qualquer crime, porém também tem que se atender que o mesmo está preso (desde início de 2017, em França), ou seja, ainda antes do acórdão do Proc n.º 106/15.1JBLSB transitar em julgado (26-09-2017). Em favor do arguido, evidencia-se a actual situação de bom comportamento no estabelecimento prisional, já tendo solicitado uma função laboral ou a integração na escola, o que ainda não aconteceu por causas alheias à sua vontade.

Pese embora o arguido não possua factores facilitadores do processo de reintegração (pouca escolaridade e pouco apoio familiar), evidencia que está motivado para, em meio livre, estar presente na vida dos dois filhos que possui e “projeta, através da sua capacidade de trabalho organizar-se de forma a poder ter um novo espaço para habitar e reintegrar o meio de forma positiva”.

(Veremos adiante em que termos podem estas considerações ter ressonância na pena conjunta a aplicar).

Este enquadramento da pena conjunta/única e dos critérios que lhe subjazem, sendo estes apenas reportados aos factos apreciados, em conjunto, e à personalidade do agente, não negligência, nem negligenciou, toda a ponderação subjacente à determinação concreta das penas parcelares, pelo que na imagem global dos factos importa sopesar toda a pluridimensionalidade de fatores relevantes, como a natureza dos crimes, o respetivo grau de dolo, a ilicitude e grau de intensidade, particularmente quanto ao rapto, extorsão e resistência e coação e respetivo modo de execução (por exemplo, a maior perigosidade e intensidade criminosa por via na atuação conjunta ou num coletivo nos crimes de rapto e extorsão), o desvalor do resultado e dos efeitos reais (v.g., o valor do produto da extorsão) ou potenciais (por exemplo, o perigo para a integridade física do GNR) para a lesão dos bens jurídicos protegidos, com reflexos na resposta às exigências de prevenção geral, que estão suficientemente ponderados na decisão recorrida, a par com fatores como o tempo dos crimes em concurso, entre outros que em concreto se julguem relevantes.

Olhando à pluralidade e natureza dos factos criminosos pelos quais o recorrente foi condenado, aqueles que se enquadram na criminalidade grave, por especialmente violenta (artigo 1.º, alíneas j) e l), do Código de Processo Penal), demandam não só significativas necessidades de prevenção especial, mas com igual relevância exigências de prevenção geral, por via do necessário reforço da consciência jurídica comunitária, no que respeita ao sentimento de segurança face à violação das normas penais, que impõem que o direito penal, traduzido também no quantum da pena, não possa ser inútil e incapaz de proteger bens jurídicos e de prevenir a criminalidade grave ou especialmente grave, ainda que seja o último recurso, mas deva servir, através da pena, para clarificar a reprovabilidade do facto típico-ilícito e demonstrar uma censura adequada por condutas reprováveis que, pelo menos, no caso dos crimes concretos de rapto, extorsão e resistência e coação, tanto isolada, como conjuntamente, são especialmente reprováveis.

A ser atendível a pretensão do recorrente, que pede a redução da pena de 6 anos e 9 meses de prisão aplicada para apenas uma pena de “5 anos de prisão ou no limite 5 anos e 6 meses de prisão” significaria, ao fim das contas, que a pena conjunta se situasse abaixo ou próximo de 1/5 da moldura atendível, resultado que nos parece pouco justificado e que só encontra eventual explicação no equivoco de que partiu, como acima se viu.

A pena conjunta/única aplicada ficou um pouco aquém do meio da moldura abstrata aplicável, o que nos parece porventura excessivo e pode justificar uma intervenção corretiva e alguma transigência à pretensão do recorrente, mas não a ponto de refletir peso excessivo às atenuantes gerais na pena conjunta/única concreta a aplicar, o que representaria um desequilíbrio relativamente incompreensível com a devida proteção de bens jurídicos e as necessidades específicas do caso quanto à prevenção especial de ressocialização, enquanto finalidades principais da pena, sendo certo que também a par delas se deve atender à reintegração tão rápida quanto possível do arguido em sociedade, através do cumprimento efetivo da prisão.

Julgamos que a decisão recorrida, na determinação da pena conjunta/única, fez uma ponderação global que não está totalmente de acordo com as melhores soluções possíveis, se tivermos por boa a orientação sustentada por Paulo Pinto de Albuquerque que, no comentário ao artigo 77.º do Código Penal, sugere a seguinte operação:

“Em regra, a ponderação da imagem global dos crimes imputados e da personalidade é feita nos seguintes termos: tratando–se de uma personalidade mais gravemente desconforme com o Direito, o tribunal determina a pena única somando à pena concreta mais grave metade (ou, em casos excecionais, dois terços) de cada uma das penas concretas aplicadas aos outros crimes em concurso; tratando–se de uma personalidade menos gravemente desconforme ao Direito, o tribunal determina a pena única somando à pena concreta mais grave um terço (ou, em casos excecionais, um quarto) de cada uma das penas concretas aplicadas aos outros crimes em concurso.” 4.

Vale isto por dizer que, no caso concreto, avaliando o resultado à luz do critério de ponderação que o referido autor sugere 5, o tribunal recorrido aditou à pena concreta mais grave (4 anos) cerca de quase metade da soma de cada uma das demais penas parcelares aplicadas (metade = ± 34,5 meses, ou seja, aplicou 2 anos e 9 meses acima da pena concreta mais grave, o que equivale a mais 33 meses), o que permite concluir que, na pena conjunta/única aplicada, o tribunal acabou por refletir o pressuposto de que a personalidade do arguido é gravemente desconforme ao Direito, no sentido de demonstrar uma tendência criminosa, o que não ficou efetivamente demonstrado e dito, mas que ficou relativamente diluído na consideração de que o arguido, depois de encarcerado, manifesta uma motivação e propósito reabilitador comprovado, que se revela autêntico.

Sendo um resultado porventura já não justificado, por excessivo, não deve ser mantido, ainda que os argumentos esgrimidos pelo recorrente não colham total pertinência no quadro em que raciocinamos, pois a decisão recorrida poderia ter refletido maior grau de proporcionalidade, mas não a ponto de ser desproporcional às finalidades da pena, à gravidade dos factos e à personalidade neles manifestada.

Concluindo, a pena conjunta/única a aplicar deve respeitar os princípios constitucionais da intervenção mínima, da proporcionalidade das penas e da igualdade, e sobretudo o princípio da culpa, pois a realização da justiça penal num Estado de Direito democrático tanto se alcança na proibição da punição sem culpa ou para além da culpa (nulla poena sine culpa – princípio da proibição do excesso), como se cumpre por meio de uma punição adequada dos culpados, quando necessária for, para salvaguarda do interesse púbico subjacente ao respeito pelo Direito do próprio Estado (nulla culpa sine poena – princípio da realização do Estado de Direito); ou seja, a adequada proteção de bens jurídicos, enquanto finalidade principal das penas, deve estar alinhada com a reintegração tão rápida quanto possível do arguido em sociedade e que no caso consente prognóstico positivo.

Afigura-se-nos assim que na determinação da medida da pena conjunta/única, o tribunal a quo poderia ainda ter ido mais além na ponderação da unidade relacional entre consideração da culpa, da prevenção e do conjunto dos factos e da personalidade do recorrente, como princípios regulativos dessa medida, sem deixar de ser fiel à medida da necessidade de tutela de bens jurídicos face ao caso concreto, refletindo assim na pena conjunta/única os critérios legais com a necessária ponderação, coerência e conexão, os quais deveriam traduzir um quantum concreto da pena situado no limite do 1/3 da moldura atendível, pelo que uma pena conjunta situada nos 6 anos de prisão nos pareceria acomodar mais adequadamente os critérios a atender e que tiveram reflexos na narrativa decisória quando aí se afirmou que “[…] Todavia, há que atender que no presente cúmulo jurídico estamos a considerar a prática de dois crimes ocorridos em 2009 (condução sem habilitação legal e resistência e coação sob funcionário - proc n.º 291/09.1...), quando o arguido tinha 21 anos de idade, ainda não tinha sido condenado em nenhuma pena e já decorreram 14 anos, e que, entretanto, o arguido está privado da liberdade desde 2017 (em França) até à presente data, sendo que estamos em crer que o período de reclusão lhe está a servir para refletir quanto aos seus comportamentos desviantes. É certo que o arguido posterior à condenação no Proc n.º 106/15.1JBLSB não praticou mais qualquer crime, porém também tem que se atender que o mesmo está preso (desde início de 2017, em França), ou seja, ainda antes do acórdão do Proc n.º 106/15.1JBLSB transitar em julgado (26-09-2017). Em favor do arguido, evidencia-se a actual situação de bom comportamento no estabelecimento prisional, já tendo solicitado uma função laboral ou a integração na escola, o que ainda não aconteceu por causas alheias à sua vontade. Pese embora o arguido não possua fatores facilitadores do processo de reintegração (pouca escolaridade e pouco apoio familiar), evidencia que está motivado para, em meio livre, estar presente na vida dos dois filhos que possui e “projeta, através da sua capacidade de trabalho organizar-se de forma a poder ter um novo espaço para habitar e reintegrar o meio de forma positiva”..


*


4.2. Conclusão:

Em conformidade, somos de parecer que o recurso deverá ser julgado parcialmente procedente, nos termos acima expostos».

2. Cumprido o disposto no nº 2 do artº 417º do CPP, não foi oferecida qualquer resposta.

III. Colhidos os vistos e realizada a conferência, cumpre decidir.

São as conclusões extraídas pelo recorrente da sua motivação que delimitam o âmbito do recurso - artº 412º, nº 1 do CPP.

E as questões suscitadas neste recurso são as seguintes:

A) Enferma o acórdão recorrido de nulidade, por excesso de pronúncia?

B) Deve ser reduzida a pena única aplicada ao arguido, ora recorrente?

IV. O tribunal a quo fixou a seguinte matéria de facto:

1. O arguido AA foi condenado, no âmbito do presente processo comum coletivo (n.º 106/15.1JBLSB), por acórdão de 2 de Fevereiro de 2017, transitado em julgado a 26 de Setembro de 2017, como co-autor e na forma consumada, pela prática de um crime de rapto, p. e p. pelo art. 161.º, n.º 1, al. a), do CP, na pena parcelar de 4 (quatro) anos de prisão e de um crime de extorsão, p. e p. pelo art. 223.º, n.º 1, do CP, na pena parcelar de 2 (dois) anos e 3 (três) meses de prisão, perpetrados em 28 e 29 de Outubro de 2015, e condenado na pena única de 4 (quatro) anos e 6 (seis) meses de prisão.

2. No aludido acórdão, foi dado como provado, nomeadamente, que o arguido:

“1. No dia 26/10/2015, cerca das 17:00 horas, os arguidos, por motivos não concretamente apurados mas relacionados com a aquisição de produto estupefaciente, dirigiram-se à residência do ofendido BB, sita na rua ..., n.º 58, R/C, em ....

2. Uma vez aí, enquanto os arguidos CC, DD e EE permaneceram no interior do veículo automóvel de marca SEA, modelo LEON, de cor branca, matrícula ..-ND-.., FF e o arguido AA bateram à porta do ofendido, que a franqueou, pois conhecia o indivíduo de nome FF, tendo, então, aqueles lhe perguntado se lhes podia “arranjar” “3 grs de coca”.

3. O BB disse-lhes que não tinha, que não vendia, mas que se os arguidos quisessem podia indicar-lhes quem vendia, ao que aqueles concordaram.

4. Foi então que o ofendido saiu de casa, acompanhado de FF e do arguido AA, tendo sido conduzido ao veículo automóvel onde se encontravam os arguidos CC, DD e EE.

5. Algum tempo depois, o ofendido apercebeu-se de que em vez de seguirem para a morada por si indicada, os arguidos fizeram seguir o veículo para um bairro de barracas, junto à localidade de ..., onde chegaram pelas 17h30 desse dia.

6. A determinada altura, os arguidos, começaram a perguntar-lhe quem dos seus conhecidos vendia droga, ao que este respondeu que quem vendia anteriormente era o “GG”.

7. Foi então acordado pelos arguidos e pelo ofendido que iriam “dar uma banhada” ao “GG”, exigindo aqueles que o ofendido encomendasse 1 kg de haxixe ao “GG”, acordando a entrega do produto para o dia seguinte.

8. Mais acordaram os arguidos e o ofendido que, pelas 12h00 do dia seguinte, encontrar-se-iam na casa deste último.

9. Seguidamente, os arguidos deixaram o ofendido junto da sua residência.

10. No dia 27.10.2015, pelas 11h00, como não tinha executado a parte do plano que tinha acordado com os arguidos, o ofendido BB saiu de sua casa e foi para a casa da sua mãe.

11. Os arguidos, com excepção do arguido FF, que não compareceu, dando conta de que o ofendido não tinha cumprido o que fora obrigado a prometer, logo combinaram entre si outro plano para lhe extorquir dinheiro.

12. Na concretização desse plano, no dia 28.10.2015, pelas 18h30, BB encontrava-se na companhia de alguns amigos na zona do jardim do ..., na rua ..., em ..., quando o arguido CC se lhe dirigiu e o agarrou pelo pescoço, fazendo uma “chave” com o braço.

13. De seguida, arrastou-o em direcção ao veículo SEAT LEON onde se encontravam os arguidos EE, DD e AA, tendo este último agarrado nas pernas de BB e ajudado o arguido CC a introduzi-lo no banco traseiro do carro.

14. Os arguidos colocaram um gorro e o forro de um encosto de cabeça de banco de carro na cabeça de BB e o veículo iniciou marcha afastando-se do local, com o arguido DD ao volante.

15. Algum tempo depois, o carro parou, em local não concretamente apurado, mas que se pensa ser na zona de ....

16. Uma vez aí, os arguidos CC e AA começaram a bater em BB, com chapadas e murros na cara, afirmando que como este não os tinha ajudado a “dar a banhada” ao “GG”, tinha de arranjar 5.000,00 (cinco mil euros).

17. O arguido CC afirmou ainda que iam amarrar o ofendido a uma árvore e que ele nunca se iria ver livre deles enquanto não pagasse a dívida.

18. Continuaram, insistindo para que BB ligasse ao “GG” ou a outro conhecido para “darem a banhada”.

19. Com receio que os arguidos concretizassem as ameaças, BB telefonou ao pai, HH e pediu que este pagasse a quantia solicitada (€ 5.000,00).

20. Os arguidos mantiveram o ofendido naquele local até cerca das 03h00.

21. Depois, pelas 03h00, do dia 29.10.2015, os arguidos levaram BB, no mencionado SEAT, até uma mata localizada entre as localidades de ... e ....

22. Durante a maior parte do tempo que BB esteve com os arguidos, encontrou-se encapuzado da forma atrás mencionada.

23. Em hora não concretamente apurada da madrugada do dia 29.10.2015, o arguido AA saiu do local, apeado, ficando ali os restantes arguidos e o ofendido.

24. De seguida, o BB realizou vários telefonemas para o pai, HH, tendo este no decurso desses telefonemas conseguido convencer os arguidos a baixarem a quantia monetária pretendida, acordando, então, a entrega de 2.000,00 (dois mil euros).

25. Os arguidos deram, então, instruções a HH para se deslocar, com o dinheiro, a uma Estação de Serviço, sita em ....

26. Ali chegado, HH deveria contactar, novamente, o telemóvel de BB, para receber mais indicações dos arguidos.

27. Cerca das 13h00, na Estação de Serviço de ..., HH, contactou o telemóvel de BB, e foi informado pelos arguidos que deveria seguir, pela auto-estrada A1, e sair para ..., onde deveria estacionar e voltar a contactar para receber novas instruções.

28. Uma vez mais, seguindo as instruções dos arguidos, após sair na saída da A1 para a ..., HH estacionou a viatura cerca das 13h10, e recebeu novas instruções, telefonicamente.

29. Desta feita, deveria seguir até ao Pingo Doce de ..., sito na Rua ... com a intersecção da Rua da ..., onde deveria parquear a sua viatura e aguardar novo contacto.

30. Chegado ao parque do Pingo Doce, na ..., cerca das 13h30, HH, parqueou a sua viatura e telefonou para o ofendido a dizer que tinha consigo a quantia monetária 2.000,00 (dois mil euros).

31. Nesse momento, os arguidos, entre os quais o arguido AA, que entretanto tinha regressado ao local, iniciaram a marcha do veículo automóvel onde se encontravam.

32. Cerca de 5 minutos depois, os arguidos e BB chegaram às imediações do estabelecimento denominado Pingo Doce, em ....

33. Momentos antes de chegarem às imediações do Pingo Doce e de estacionaram o veículo, o arguido AA saiu da viatura e disse para os arguidos DD, EE e CC recolherem o dinheiro, aguardando à distância.

34. Após estacionarem o veículo no parque de estacionamento do Pingo Doce, em ..., permaneceram no seu interior o arguido DD e BB.

35. Os arguidos EE e CC deslocaram-se em direcção a HH, que se encontrava junto à rotunda do Pingo Doce, tendo este feito a entrega de um envelope contendo os 2.000€ (dois mil euros) que o arguido EE recebeu e guardou.

36. De seguida, o arguido EE fez sinal, com o braço, para alguém que distava cerca de 60 metros daquele local.

37. Após o gesto do arguido EE, apareceram apeados, na direcção do mesmo, o arguido DD e o ofendido BB, que seguiu em direcção do seu pai.

38. Após o reencontro entre o HH e BB, estes seguiram, apeados, em direcção ao parque do Pingo Doce, para a viatura do primeiro.

39. Os arguidos juntaram-se e seguiram apeados, ao longo da Rua ..., afastando-se daquele local.

40. Neste preciso momento, a Polícia Judiciária procedeu à abordagem e detenção, em flagrante, dos arguidos.

41. No bolso direito do casaco do arguido EE, foi encontrado um envelope, contendo os 2.000€ (dois mil euros) entregues por HH.

42. O arguido AA ao ver a actuação da Polícia Judiciária sobre os arguidos DD, EE e CC fugiu apeado.

43. No dia 29/10/2015, HH entregou aos arguidos EE, DD e CC a quantia de 2.000,00 (dois mil euros) por sentir receio que os arguidos atentassem contra a integridade física ou vida do seu filho, o ofendido BB.

44. No dia 29/10/2015, ao actuarem da forma descrita, de comum acordo e em conjugação de esforços e vontades, os arguidos DD, EE, CC e AA quiseram cercear a liberdade do ofendido BB, privando-o da sua liberdade de locomoção e de decisão, agindo com o intuito, concretizado, de obterem uma vantagem patrimonial a que sabiam não ter direito, usando contra o mesmo de violência física, determinando HH a entregar-lhes a quantia monetária de €2.000,00 (dois mil euros), fazendo-o acreditar que iriam molestar fisicamente o BB, causando àquele um prejuízo de €2.000,00 (dois mil euros).

45. Os arguidos agiram com vontade livremente determinada, bem sabendo que as condutas acima descritas eram proibidas e punidas por lei.»

3. O arguido AA por acórdão de 15 de Julho de 2014, transitado em julgado em 4 de Novembro de 2016, no âmbito do processo comum colectivo n.º 291/15.1..., que correu seus termos no Juízo Central Criminal de ... – Juiz 1, foi ainda condenado, como autor material e na forma consumada, pela prática de um crime de condução sem habitação legal, p. e p. pelo art. 3.º, n.º 2, do Dec.-Lei n.º 2/98, de 03-01, na pena parcelar de 12 meses de prisão e de um crime de resistência e coação sob funcionário, p. e p. pelo art. 347.º do CP, na pena parcelar de 2 anos e 6 meses, perpetrados em 27 de Março de 2009, e condenado na pena única de 2 anos e 6 meses de prisão.

4. No aludido acórdão, foi dado como provado, nomeadamente, que o arguido:

«No dia 27.03.2009, pelas 21h30, na Estrada Nacional, n.º 8, dentro da localidade ..., no cruzamento de ..., Freguesia ..., Concelho de ..., no âmbito de uma acção de fiscalização rodoviária (operação Stop), levada a cabo pelo OPC (GNR do Posto Territorial da ...), o Sargento-Ajudante da GNR, Comandante do Posto da mesma Guarda, da ..., II, encontrava-se acompanhado de outros elementos da GNR, que constituíam a patrulha designada para a operação de fiscalização, em serviço no Posto Territorial ....

Todos se encontravam devidamente uniformizados, incluindo coletes reflectores e bastão luminoso, e também por uma viatura devidamente caracterizada da GNR.

Pelas 21h50, no mesmo dia 27.03.2009, o Sargento Ajudante da GNR, II com o uso bastão luminoso, de cor vermelha, fez sinal de paragem ao arguido/condutor AA, que conduzia o veículo de marca Seat, modelo Ibiza, de cor azul, com a matrícula ..-..-LN, que circulava na Estrada Nacional, n.º 8, dentro da localidade ..., no cruzamento de ..., Freguesia ..., Concelho de ..., no sentido de marcha ....

O arguido/condutor AA, abrandou a marcha do veículo e encostou a viatura à berma, fazendo crer aos elementos da GNR que pretendia parar.

Assim, e por forma a fiscalizar o veículo e os seus ocupantes, o Sargento Ajudante da GNR II, aproximou-se da porta do lado do condutor e em acto seguido o arguido/condutor AA, guinou bruscamente o veículo em direcção ao Sargento Ajudante da GNR II por forma a escapar à fiscalização policial.

Em consequência, o Sargento Ajudante da GNR II, para se proteger agarrou-se/apoiou-se e ao vidro da porta do condutor que estava ligeiramente aberto tendo partido e foi projectado para o chão, para o centro da faixa de rodagem.

Graças a este movimento defensivo, conseguiu evitar ser atingido pelos rodados traseiros do carro, que prosseguiu a marcha em alta velocidade.

O arguido/condutor AA não obedeceu à ordem de parar, e acelerou o carro fugindo do local a alta velocidade.

Nessa altura o arguido JJ, Guarda da GNR, que se encontrava também no local junto da viatura policial e após olhar e ver o Sargento Ajudante da GNR, II caído no chão, e o veículo, a colocar-se em fuga em alta velocidade, a qual não se apurou concretamente.

Deslocou-se para o meio da faixa de rodagem, ficando de frente para si a traseira da viatura, retirou a arma de serviço - pistola Walther P.38 de 9mm - do coldre e empunhando a mesma, efectuou o movimento de colocar a mão direita para cima, levantou a arma que se encontrava na sua mão e fez pontaria específica na direcção do veículo para baixo e efectuou dois disparos simultâneos, por forma a deter a marcha do veículo, para intimidar o condutor e demovê-lo assim da fuga que tinha empreendido.

O disparo foi efectuado quando o arguido JJ se encontrava a uma distância próxima da viatura, embora não concretamente apurada.

O local onde disparou não apresentava quaisquer obstáculos à visibilidade, podendo o arguido avistar, em toda a extensão e largura, a faixa de rodagem.

Foi nesse circunstancialismo que o arguido JJ, apontou a arma para a viatura e disparou directamente para a mesma, tendo um dos disparos atingido a parte traseira da viatura em questão.

Apesar dos disparos efectuados pelo arguido JJ, o arguido/condutor AA, não deteve a marcha e seguiu na direcção no sentido ....

O arguido AA no dia 27.03.2009, pelas 21h30, na Estrada Nacional, n.º 8, dentro da localidade ..., no cruzamento de ..., no sentido de marcha ..., Concelho de ... conduzia o veículo automóvel de marca Seat, modelo Ibiza, de cor azul, com a matrícula ..-..-LN, sem que para tal possuísse título de habilitação legal.

O arguido, agiu com o propósito concretizado de conduzir o veículo automóvel, bem sabendo que não possuía o título de condução necessário e legalmente exigido para o efeito, sendo que, não obstante esse conhecimento, quis adoptar tal comportamento conforme sucedeu.

Em tal circunstancialismo de tempo e de lugar, no âmbito de uma acção de fiscalização de trânsito, o arguido ao não ter obedecido à ordem de parar emanada pelo militar da GNR que se encontrava devidamente uniformizado, dirigindo-se ao veículo conduzido pelo arguido, levantou verticalmente o bastão luminoso ordenando-lhe, assim, que parasse, porém. apesar de ter visto tal sinal e de ter ficado ciente do seu significado, o arguido não imobilizou a viatura, que continuou a sua marcha.

O arguido sabia estar obrigado a parar e sabia que, ao não acatar a referida ordem, estava a faltar à obediência devida, a ordem legítima, emanada por uma autoridade competente, cuja recusa sabia corresponder à prática de um crime, por estar a conduzir na via pública.

Encontrava-se igualmente ciente que devia obediência à ordem que lhe foi transmitida e das consequências que daí adviriam.

Agiu livre, voluntária e conscientemente, conhecendo a proibição legal da sua conduta.

Em tal circunstancialismo de tempo e de lugar, o arguido ao ter guinado bruscamente o veículo em direcção ao Sargento Ajudante da GNR II e fazendo com que este fosse projectado para o chão, para o centro da faixa de rodagem o arguido pretendeu e conseguiu opor-se a que o agente que se encontrava em serviço e devidamente uniformizado não o detivesse.

O arguido não ignorava ser ele militar da GNR, em exercício de funções e sabia que devia obedecer à ordem de paragem.

O arguido no exercício da condução colocou em perigo a integridade física do agente de autoridade que o mandara parar, sem qualquer justificação para tal, não parou, como desde logo se impunha, antes abrandou e posteriormente guinou na direcção do militar, tendo acelerado até a sua marcha, não obedecendo ao sinal de paragem feito pelo militar da GNR ali presente e obrigando-o a desviar-se e a cair no chão, sob pena de, não o fazendo, ser atingido pelo veículo do arguido.

O arguido agiu livre, voluntária e conscientemente, com o propósito de causar as lesões, bem sabendo da ilicitude da sua conduta esta era proibida e punida por lei.

O arguido agiu de forma livre, deliberada e consciente, estando ciente de que a sua conduta era proibida e punida pela lei penal, não se coibindo, no entanto, de a praticar.»

5. Por Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, proferido em 03-03-2016 e transitado em julgado em 08-02-2017, no Processo de Mandado de Detenção Europeu (MDE) n.º 1642/15.5..., foi decidida a entrega do arguido às autoridades francesas no âmbito de um mandado de detenção europeu emitido pela autoridade judiciária da Republica Francesa para cumprimento de uma pena de 6 anos de prisão, a que o arguido AA foi condenado no âmbito de acórdão de 24-06-2011 do Tribunal de Paris, pela prática, em Agosto de 2006, por um crime de agressão sexual através de ofensas sexuais com violência sobre criança com menos de 15 anos e em reunião.

6. O arguido por força do acórdão descrito em 5. foi transferido em 07-03-2017 para França para cumprimento da pena de 6 anos a que ali foi condenado.

7. No âmbito dos presentes autos (Proc. n.º 106/15.1JBLSB) foi emitido, em 26-01-2018, Mandado de Detenção Europeu às Autoridades Franceses, tendo por Acórdão do Tribunal da Relação de Paris de 24-02-2021, sido determinado a entrega do arguido a Portugal. O arguido foi detido, à ordem dos presentes autos, pelas Autoridades Francesas em 28-04-2021 e entregue pessoalmente às Autoridades Portuguesas no dia 5 de Maio de 2021.

8. No âmbito do processo de MDE n.º 416/23.4..., que correu seus termos no Tribunal da Relação de ..., o arguido AA em 22-03-2023 declarou que prescindia do beneficio da regra da especialidade quanto aos factos do Proc n.º 291/09.1...

9. São ainda os seguintes os antecedentes criminais registados no certificado de registo criminal do arguido AA:

i. Por sentença proferida em 10/02/2010 e transitada em julgado em 20/07/2010 no âmbito do processo sumário n.º 116/10.5... do Juízo de Pequena Instância Criminal de Sintra, foi o arguido condenado pela prática, no dia 27/01/2010, de um crime de condução sem habilitação legal, na pena de 120 dias de multa, à taxa diária de € 5,00, no montante global de € 600,00. Esta pena foi declarada extinta pelo pagamento em 31-10-2011.

ii. Por sentença proferida em 15/12/2010 e transitada em julgado em 16/09/2011 no âmbito do Processo n.º 851/05.0... do 3.º Juízo Criminal de ..., foi o arguido condenado pela prática, no dia 15/10/2005, de três crimes de roubo, na pena única de 10 meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 1 ano. A pena foi declarada extinta pelo decurso do tempo (art. 57.º do CP) em 12-03-2013.

iii. Por sentença proferida em 18/01/2012 e transitada em julgado em 17/09/2013 no âmbito do Processo n.º 253/08.6... do 4.º Juízo Criminal de ..., foi o arguido condenado pela prática, no dia 16/12/2008, de um crime de condução sem habilitação legal e um crime de condução perigosa de veículo rodoviário, na pena única de 10 meses de prisão. A pena foi declarada extinta pelo cumprimento em 20-08-2014.

iv. Por sentença proferida em 17/06/2011 e transitada em julgado em 17/06/2011 no âmbito do Processo Sumaríssimo n.º 642/10.6... do 2.º Juízo de Pequena Instância Criminal de ..., foi o arguido condenado pela prática, no dia 27/06/2010, de um crime de detenção de arma proibida e um crime de condução sem habilitação legal, na pena única de 110 dias de multa, à taxa diária de € 6,00, no total de € 660,00. A pena foi declarada extinta pelo pagamento em 11-08-2014.

v. Por acórdão proferido em 08/07/2011 e transitado em julgado em 23/09/2011 no âmbito do Processo Comum Colectivo n.º 1963/10.3..., foi o arguido condenado pela prática, em 18/11/2010, de um crime de furto qualificado e um crime de detenção de arma proibida, na pena única de 3 anos e 3 meses de prisão, suspensa na sua execução por idêntico período, com sujeição a regime de prova. A pena foi declarada extinta pelo decurso do tempo (art. 57.º do CP) em 23-12-2014.

vi. Por sentença proferida em 29/04/2016 e transitada em julgado em 01/06/2016 no âmbito do Processo Comum n.º 317/10.6... do Juízo Local Criminal de ..., foi o arguido condenado pela prática, no dia 15/11/2010, de um crime de detenção de arma proibida, na pena de 6 meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 1 ano. A pena foi declarada extinta pelo decurso do tempo (art. 57.º do CP) em 01-06-2017.

vii. No âmbito do processo abreviado com o n.º 142/17.3..., do Juízo Pequena Criminalidade de ..., por sentença proferida em 21 de Setembro de 2021 e transitado em julgado em 21 de Outubro de 2021, pela prática, em autoria material, de um crime de consumo de estupefaciente, p. e p. pelo art. 40.º, n.º 2, do DL n.º 15/93, de 22-01, por factos ocorridos em 28-02-2017, na pena de 80 dias de multa à taxa diária de 5,00€.

10. Quanto às condições pessoais, familiares, sociais e económicas do arguido:

AA é natural de ..., país onde tanto ele como o irmão germano, residiram ao cuidado de familiares, desde os quatro aos oito anos, abandonados pela mãe, tal como lhe foi transmitido. Nesta altura, o pai foi buscá-los, passando a integrar o novo agregado constituído pelo progenitor, madrasta e mais três irmãos. A adaptação foi difícil, porquanto eram constantes os maus tratos e negligência por parte da madrasta, o que veio a agudizar a sua instabilidade emocional.

AA, tinha 13 anos quando o pai se separou da madrasta, permanecendo na mesma habitação com o pai que para fazer face às despesas do agregado, trabalhava muitas horas, sem capacidade de supervisionar o comportamento do arguido.

A influência do grupo de pares com comportamentos desviantes, que caraterizava o bairro que habitavam contribuiu para o início de uma fase ainda mais negativa no seu percurso vivencial. Frequentou a escola na idade própria, sentindo, no entanto, algumas dificuldades na aprendizagem das matérias dadas, apenas concluindo o ensino básico. Mas as condutas desviantes que se acentuaram, levaram à sua institucionalização, onde terminou o 6.º ano de escolaridade, através de um curso de marcenaria e serralharia.

Depois de deixar o colégio procurou juntar-se à mãe que se encontrava emigrada em ..., com vida organizada e novo agregado constituído, mas os longos anos de separação e falta de contacto contribuíram para frequentes desentendimentos, abandonando o agregado materno, regressando a Portugal, onde permaneceu algum tempo junto do pai até 2010, no .... Este veio a falecer em 2012.

Manteve uma ligação afetiva estável, da qual tem dois filhos, um rapaz com 15 anos e uma menina com 6 anos. A ex-mulher terminou a relação em 2019, quando o arguido estava a cumprir pena de prisão de 2017 a 2021 em França por processo de condenação que tinha naquele país.

AA em 2017 mantinha ligação harmoniosa com a ex-esposa e os filhos. Mantinha atividade profissional nas limpezas no ... Shopping e sempre que necessário mantinha atividades em biscates para compensar as despesas do agregado. Através desta ligação conseguiu reorganizar a sua vida. Beneficiavam do apoio dos sogros que residiam próximo.

Divorciou-se em 2021, sendo que manteve contactos, com a ex-mulher, na prisão em França que o visitou até 2019.

Neste momento o que o mantém equilibrado emocionalmente é o facto de poder de vez em quando falar telefonicamente com os filhos, uma vez que a ex-esposa não os deixa visitá-lo.

AA foi transferido para o Estabelecimento Prisional de ... desde 02.12.2021, beneficiando apenas de visitas esporádicas de uma tia, irmão mais novo e da cunhada, uma vez que esta tem o marido, irmão do recluso a cumprir pena de prisão no Estabelecimento Prisional ....

Não exerce qualquer atividade por incapacidade de resposta por parte do Estabelecimento Prisional, tendo já solicitado uma função laboral ou a integração na escola, mas demonstra hábitos de trabalho.

Não tendo resolvido as questões de relacionamento com a mãe desde a sua primeira estada em ..., por esta nunca lhe ter explicado porque os tinha abandonado, a ele e os irmãos, tem, no entanto, mantido contacto com a mesma, por ter tido conhecimento que esta se encontra em prisão preventiva no Estabelecimento Prisional de ... acusada de tráfico de droga.

Quando em meio livre, aproveitará o apoio que a família lhe possa disponibilizar, mas terá sempre a casa do pai no ..., local onde ele não gostaria de regressar devido ao elevado risco de influência pelo grupo de pares.

Projeta, através da sua capacidade de trabalho organizar-se de forma a poder ter um novo espaço para habitar.

AA face à anterior conduta assume os factos, necessitando de uma orientação, essencialmente no que poderá esperar por parte da família e conseguir organizar-se uma vez que a sua maior preocupação é manter o contacto e ligação estreita com os filhos.

No Estabelecimento Prisional de ... tem procurado de forma irregular as consultas de psicologia. O arguido vai desenvolver através da sua capacidade e hábitos de trabalho e a ajuda proveniente por parte dos elementos da família alargada para poder reintegrar o meio de forma positiva. Não beneficiou até ao momento de medidas de flexibilização da pena.

AA processou o seu desenvolvimento, essencialmente marcado pelo abandono da mãe e os elementos difíceis que o acompanharam desde a infância, adolescência e ainda na fase adulta, em que foi marcado por momentos de falta de afetividade.

Não apresenta neste momento fatores facilitadores do processo de reintegração social que deverá passar pela aquisição de competências e a frequência da valência em psicologia e de meios para criar as condições necessárias e viáveis para a sua reintegração em sociedade.

V. Em face da matéria de facto acabada de descrever, assim se decidiu no acórdão recorrido:

«(…)

Conclui-se, pelo exposto, aplicando os critérios de realização da operação de cúmulo jurídico já aludidos e tendo em conta as especificidades do princípio da especialidade a que alude o art. 7.º, n.ºs 1 e 2, da Lei n.º 65/2003, de 23-08, que, existindo uma relação de concurso entre o crime, pelo qual foi o arguido foi condenado nestes autos e os crimes subjacentes à condenação, sofrida pelo mesmo arguido, no âmbito do processo n.º 291/09.1..., importa encontrar a moldura penal do concurso.

De acordo com o n.º 2 do artigo 77.º, do Código Penal, tal moldura terá, como limite máximo, a soma das penas concretamente aplicadas aos vários crimes em concurso e, como limite mínimo, a mais elevada das penas parcelares a cumular.

Consideradas as penas parcelares em presença, a moldura abstracta terá como limite mínimo 4 (quatro) anos e limite máximo 9 (nove) anos e 9 (nove) meses de prisão.

Dentro da moldura assim fixada, a medida da pena única a aplicar será determinada em função das exigências gerais de culpa e de prevenção, fornecendo a lei, para além dos critérios gerais de medida da pena contidos no art. 71.º, n.º 1, do Código Penal, um critério especial, na determinação concreta da pena do concurso, que indica que “devem ser considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente" (art. 77.º, n.º 1, 2.ª parte).

A imposição de tais limites não transforma a decisão cumulatória num mero exercício de aritmética atenta a necessidade de apreciação, quer dos factos, quer das circunstâncias em que os mesmos foram praticados e, na fixação da pena única, deve ponderar-se tudo o que milite a favor ou contra o agente. Com a fixação da pena conjunta pretende-se sancionar o agente, não só pelos factos individualmente considerados, mas também e especialmente pelo respetivo conjunto, não como mero somatório de factos criminosos, mas enquanto revelador da dimensão e gravidade global do comportamento delituoso do agente, visto que a lei manda que se considere e pondere, em conjunto, (e não unitariamente) os factos e a personalidade do agente. Como refere Figueiredo Dias, “Direito Penal Português As Consequências Jurídicas do Crime”, Coimbra, 1993, págs.290/292, é como se o conjunto dos factos fornecesse a gravidade do ilícito perpetrado.

Importante na determinação concreta da pena conjunta será, pois, a averiguação sobre se ocorre ou não ligação ou conexão entre os factos em concurso, a existência ou não de qualquer relação entre uns e outros, bem como a indagação da natureza ou tipo de relação entre os factos, sem esquecer o número, a natureza e gravidade dos crimes praticados e das penas aplicadas, tudo ponderado em conjunto com a personalidade do agente referenciada aos factos, tendo em vista a obtenção de uma visão unitária do conjunto dos factos, que permita aferir se o ilícito global é ou não produto de tendência criminosa do agente, bem como fixar a medida concreta da pena dentro da moldura penal do concurso.

Como vem sendo explanado pelo Supremo Tribunal de Justiça “(…) A determinação da pena do concurso exige um exame crítico de ponderação conjunta sobre a conexão e interligação entre todos os factos praticados e a personalidade do seu autor, de forma a alcançar-se a valoração do ilícito global e entender-se a personalidade neles manifestada, de modo a concluir-se pela motivação que lhe subjaz, se emergente de uma tendência para delinquir, ou se se trata de pluriocasionalidade não fundamentada na personalidade, tudo em ordem a demonstrar a adequação, justeza, e sobretudo, a proporcionalidade, entre a pena conjunta a aplicar e a avaliação conjunta daqueles dois factores (…)”, havendo que “(…) indagar se a repetição operou num quadro de execução homogéneo ou diferenciado, quais os modos de actuação, de modo a concluir se estamos face a indícios desvaliosos de tendência criminosa, ou se estamos no domínio de uma mera ocasionalidade ou pluriocasionalidade, tendo em vista configurar uma pena que seja proporcional à dimensão do crime global, pois ao novo ilícito global, a que corresponde uma nova culpa, caberá uma nova, outra, pena (…) não se visa re-sancionar o agente pelos factos de per si considerados, isoladamente, mas antes procurar uma “sanção de síntese”, na perspectiva da avaliação da conduta total, na sua dimensão, gravidade e sentido global, da sua inserção no pleno da conformação das circunstâncias reais, concretas, vivenciadas e específicas de determinado ciclo de vida do(a) arguido(a) em que foram cometidos vários crimes (…)” 6.

Tudo deverá passar-se, em consequência, "como se o conjunto dos factos fornecesse a gravidade do ilícito global perpetrado, sendo decisiva para a sua avaliação a conexão e o tipo de conexão que entre os factos concorrentes se verifica e, bem assim, a personalidade (revelada) do condenado. Na avaliação da personalidade - unitária - do agente relevará, sobretudo, a questão de saber se o conjunto dos factos é reconduzível a uma tendência (ou eventualmente mesmo a uma "carreira") criminosa, ou tão só a uma pluriocasionalidade que não radica na personalidade: só no primeiro caso, já não no segundo, será cabido atribuir à pluralidade de crimes um efeito agravante dentro da moldura penal conjunta" (Figueiredo Dias, Direito Penal Português: Parte Geral II, As Consequências Jurídicas do Crime, 1.ª edição, Coimbra Editora, p. 291).

Como se assume no Acórdão do STJ de 11-03-2020, proferido no Proc. n.º 15/15.4JACBR.2.S1 - 3.ª Secção 7, no qual nos revemos nos ensinamentos “V - O denominado «fator de compressão», deverá funcionar como critério valorativo (aferidor) do rigor e da justeza do cúmulo jurídico de penas, e deverá adotar frações ou logaritmos diferenciados em função da fenomenologia dos crimes do concurso, mas que no âmbito do mesmo tipo de crime devem ser idênticos, podendo variar ligeiramente em função da personalidade do arguido revelada pelos factos e do modo de execução dos crimes do concurso. VI - A proporcionalidade e a proibição do excesso, que deve presidir à fixação da pena conjunta, deverá obter-se através da ponderação entre a gravidade do facto global (do concurso de crimes enquanto unidade de sentido jurídico), as caraterísticas da personalidade do agente nele revelado (no conjunto dos factos ou na atividade delituosa) e a intensidade ou gravidade da medida da pena conjunta no ordenamento punitivo.”

Aplicando as considerações expendidas ao caso concreto, verifica-se que no processo n.º 106/15.1JBLSB estão em causa um crime de rapto e um crime de extorsão e no Proc. n.º 291/09.1... estão em causa um crime de condução sem habilitação legal e um crime de resistência e coação sob funcionário. São plúrimos e bem distintos os bens jurídicos protegidos, pois no processo n.º 106/15.1JBLSB estão em causa bens jurídicos que atentam com a liberdade pessoal e contra o património e no processo n.º 291/09.1... estão em causa bens jurídicos como a segurança rodoviária e contra a autoridade pública, o que evidencia que o arguido atentou contra uma pluralidade de bens jurídicos e com desrespeito por várias regras de vivência em sociedade; são factos que distam vários anos entre si, pois no processo 106/15.1JBLSB estamos perante factos praticados em Outubro de 2015, enquanto no processo n.º 291/09.1... tratam de factos praticados em Março de 2009.

Mas se analisarmos os vários antecedentes criminais do arguido verifica-se que o mesmo praticou crimes durante vários anos como em 2005, 2006, 2008, 2009, 2010 e 2015 e por fim em 2017, de diversas naturezas, sendo que quando praticou os factos (extorsão e rapto) em causa no processo n.º 106/15.1JBLSB já tinha cumprido uma pena de prisão efetiva (no proc. n.º 253/08.6...), o que demonstra que a condenação anterior de prisão não surtiu suficiente efeito ressocializador, não tendo tal circunstância inibido o mesmo de delinquir novamente em 2015 (praticando factos de especial gravidade).

Tendo em conta a natureza dos vários factos praticados ao longo dos anos, o mesmo evidencia uma personalidade incapaz de se reger pelos valores tutelados pelo direito. É elevado o grau de culpa do arguido, na medida em que praticou todos os crimes com dolo direto. Estamos também perante um elevado grau de ilicitude dos factos praticados pelo arguido, consubstanciado no elevado desvalor dos 4 crimes por si praticados (sendo que dois dele com recurso a violência contra pessoa – como foi o caso do crime de rapto, e no caso do crime de resistência e coação sob funcionário), sendo elevadas as exigências de prevenção geral que se fazem sentir, não só pelo alarme social que os vários crimes em apreço provocam, como também pela sua danosidade social, sendo também elevadas as necessidades de prevenção especial face ao quantum de condenações já sofridas.

Porém, também se teve em consideração que os vários crimes praticados pelo arguido de 2005 até 2010 8, incluindo a condenação do Proc n.º 291/09.1..., ocorreram todos em data anterior à primeira condenação transitada em julgado, ou seja, foram praticados todos esses factos sem que ainda o arguido tivesse sido condenado (com trânsito em julgado) numa pena.

Contudo, a imagem global transmitida pelo conjunto dos factos praticados demonstra que o arguido carece manifestamente de ressocialização, manifestando reiterado desrespeito por vários bens jurídicos, sejam de natureza pessoal com violência (v.g. traduzido pela prática do sequestro 9), sejam de natureza patrimonial (pela prática extorsão 10), bem como pela convivência social pacífica, desrespeitando militares da GNR/Autoridade Pública no exercício de funções empregando violência (pela prática da resistência e coação sob funcionário 11), seja atentatório da segurança rodoviária (pela prática da condução sem habilitação legal 12).

Todavia, há que atender que no presente cúmulo jurídico estamos a considerar a prática de dois crimes ocorridos em 2009 (condução sem habilitação legal e resistência e coação sob funcionário - proc n.º 291/09.1...), quando o arguido tinha 21 anos de idade, ainda não tinha sido condenado em nenhuma pena e já decorreram 14 anos, e que, entretanto, o arguido está privado da liberdade desde 2017 (em ...) até à presente data, sendo que estamos em crer que o período de reclusão lhe está a servir para refletir quanto aos seus comportamentos desviantes. É certo que o arguido posterior à condenação no Proc n.º 106/15.1JBLSB não praticou mais qualquer crime, porém também tem que se atender que o mesmo está preso (desde início de 2017, em ...), ou seja, ainda antes do acórdão do Proc n.º 106/15.1JBLSB transitar em julgado (26-09-2017).

Em favor do arguido, evidencia-se a actual situação de bom comportamento no estabelecimento prisional, já tendo solicitado uma função laboral ou a integração na escola, o que ainda não aconteceu por causas alheias à sua vontade. Pese embora o arguido não possua factores facilitadores do processo de reintegração (pouca escolaridade e pouco apoio familiar), evidencia que está motivado para, em meio livre, estar presente na vida dos dois filhos que possui e “projeta, através da sua capacidade de trabalho organizar-se de forma a poder ter um novo espaço para habitar e reintegrar o meio de forma positiva”.

Tudo sopesado, considera-se justa a fixação da pena única de 6 (seis) anos e 9 (nove) meses de prisão, necessariamente efectiva».

VI. Decidindo:

A) Enferma o acórdão recorrido de nulidade, por excesso de pronúncia?

Entende o recorrente que sim, porquanto, para além de mencionar as penas abrangidas pelo cúmulo jurídico, o acórdão recorrido faz referência a penas antigas sofridas pelo arguido, algumas por factos praticados há mais de dez anos, bem como a penas suspensas já consideradas extintas pelo cumprimento. E adianta que, «encontrando-se averbadas no CRC, não deveria o douto Tribunal socorrer-se dessas mesmas decisões condenatórias como argumento “de peso” dada a sua não particular relevância».

Vejamos:

Dispõe-se no artº 77º, nº 1 do Cod. Penal que

“Quando alguém tiver praticado vários crimes antes de transitar em julgado a condenação por qualquer deles é condenado numa única pena. Na medida da pena são considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente”.

Em caso de conhecimento superveniente de concurso, estatui-se no artº 78º, nº 1 do mesmo diploma que são aplicáveis as regras constantes do artigo anterior e, nomeadamente, a prevista no nº 1 do citado artº 77º, acabada de transcrever.

De outro lado, estatui-se no nº 1 do artº 71º do Cod. Penal que a determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, “é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção”, acrescentando-se no nº 2 do mesmo dispositivo que nessa determinação deverão ser consideradas todas as circunstâncias que depuserem a favor do agente ou contra ele e, nomeadamente, a sua conduta anterior ao facto.

É inegável que “a medida concreta da pena do concurso é determinada (…) em função da culpa e da prevenção – arts. 40.º e 71.º, do CP –, mas levando em linha de conta o critério específico da «consideração em conjunto dos factos e da personalidade do agente» previsto no art. 77.º, n.º 1, segundo segmento, do CP” 13.

Ou, como se refere no Ac. STJ de 16/5/2019, Proc. 790/10.2JAPRT.S1 14, “a determinação da medida concreta da pena única deve atender, como qualquer outra pena, aos critérios gerais da prevenção e da culpa (art. 71.º, do CP); e ainda a um critério especial: a consideração conjunta dos factos e da personalidade do agente, na sua relação mútua, agora reavaliada à luz do conhecimento superveniente dos novos factos (citado art. 77.º, n.º 1, do CP). Ao tribunal impõe-se uma apreciação global dos factos, tomados como conjunto, e não enquanto mero somatório de factos desligados, na sua relação com a personalidade do agente, neles revelada”.

Daí que tudo quanto interesse à caracterização da personalidade do arguido, elemento aglutinador de todas as condutas integradoras dos crimes em concurso, possa e deva ser tomado em consideração na determinação da pena única a aplicar.

E no desenhar dessa personalidade do arguido assume natural importância, como é evidente, a sua conduta anterior aos factos abrangidos pelo concurso, os seus antecedentes criminais, a sua maior ou menor capacidade para ser influenciado e determinado pela aplicação de uma pena (máxime, de privação da liberdade).

Portanto, a apreciação dos antecedentes criminais do arguido, vertidos no seu certificado de registo criminal, na ponderação da aplicação de uma pena (única ou singular), nunca pode ser considerada como algo fora do objecto do processo, como algo subtraído ao conhecimento do julgador e que, sendo conhecido, se traduz em excesso de pronúncia, determinando a nulidade da sentença 15.

Outra questão – que, cremos, não é sequer suscitada (ao menos de forma expressa e inequívoca) pelo recorrente - é a possibilidade de as penas relativas a crimes praticados em momento anterior aos que ora se encontram em concurso se encontrarem extintas, não devendo já constar do registo criminal respectivo e não podendo, como tal, ser consideradas na apreciação da personalidade do arguido e na determinação da pena única a aplicar.

Essa questão é suscitada pelo Exmº Magistrado do MºPº em 1ª instância e retomada no douto parecer do Exmº Procurador-Geral Adjunto neste Supremo Tribunal de justiça em termos que, adiantando conclusões, merecem a nossa total adesão.

Com efeito:

No que concerne às penas suspensas na sua execução, extintas pelo cumprimento, e à (im)possibilidade de integrarem a pena única a aplicar, o acórdão recorrido é claro:

“É entendimento da jurisprudência dos nossos tribunais superiores que a pena de prisão suspensa na sua execução que foi declarada extinta nos termos do art. 57.º, n.º 1, do CP, não integra o cúmulo jurídico superveniente de penas.

(…)

O mesmo se diga quanto às penas de multas extintas (pelo pagamento), também se todas as penas de multa se encontram extintas não integram o cúmulo jurídico e as suas condenações não servem como marco para a data do marco do primeiro trânsito em julgado.

(…)

Verifica-se que todas as condenações em penas de prisão suspensas na sua execução, encontram-se extintas pelo decurso do tempo, nos termos do art. 57., n.º 1, do CP. Constata-se também que à exceção da condenação em pena de multa do Proc. n.º 142/17.3... que se mantém activa, todas as restantes penas de multas estão extintas pelo pagamento. E atenta a data das condenações das várias penas de multa, verifica-se que a pena de multa do Proc. n.º 142/17.3... não está em concurso com as demais condenações em pena de multa, dado que os factos do processo n.º 142/17.3... ocorreram em 28-02-2017, ou seja, ocorreram depois de qualquer um dos trânsitos em julgado das condenações em pena de multa.

Assim, terão que ser expurgadas do concurso a realizar todas as penas de prisão suspensas na sua execução, extintas nos termos do art. 57.º do CP e ainda as penas de multa extintas.” O acórdão recorrido ponderou, na determinação da medida concreta da pena única, os antecedentes criminais do arguido.

Fê-lo nos seguintes termos:

“Mas se analisarmos os vários antecedentes criminais do arguido verifica-se que o mesmo praticou crimes durante vários anos como em 2005, 2006, 2008, 2009, 2010 e 2015 e por fim em 2017, de diversas naturezas, sendo que quando praticou os factos (extorsão e rapto) em causa no processo n.º 106/15.1JBLSB já tinha cumprido uma pena de prisão efetiva (no proc. n.º 253/08.6...), o que demonstra que a condenação anterior de prisão não surtiu suficiente efeito ressocializador, não tendo tal circunstância inibido o mesmo de delinquir novamente em 2015 (praticando factos de especial gravidade).

Tendo em conta a natureza dos vários factos praticados ao longo dos anos, o mesmo evidencia uma personalidade incapaz de se reger pelos valores tutelados pelo direito”.

Dispõe-se no artº 11º da Lei 37/2015, de 5/5:

“1 - As decisões inscritas cessam a sua vigência no registo criminal nos seguintes prazos:

a) Decisões que tenham aplicado pena de prisão ou medida de segurança, com ressalva dos prazos de cancelamento previstos na Lei n.º 113/2009, de 17 de setembro, com respeito aos crimes previstos no capítulo V do título I do livro II do Código Penal, decorridos 5, 7 ou 10 anos sobre a extinção da pena ou medida de segurança, se a sua duração tiver sido inferior a 5 anos, entre 5 e 8 anos ou superior a 8 anos, respetivamente, e desde que, entretanto, não tenha ocorrido nova condenação por crime de qualquer natureza;

b) Decisões que tenham aplicado pena de multa principal a pessoa singular, com ressalva dos prazos de cancelamento previstos na Lei n.º 113/2009, de 17 de setembro, com respeito aos crimes previstos no capítulo V do título I do livro II do Código Penal, decorridos 5 anos sobre a extinção da pena e desde que, entretanto, não tenha ocorrido nova condenação por crime de qualquer natureza;

(…)” (subl. nossos).

Ora, como bem se refere na resposta da Exmª Magistrada do MºPº na 1ª instância, “analisando o CRC do arguido, facilmente se depreende que após a data de extinção das penas ali inscritas, ao mesmo sobrevieram novas condenações, e, por isso, não se encontram preenchidos os requisitos de que depende o cancelamento do registo criminal”.

Com efeito, tomando em consideração as condenações referidas no ponto 9 dos factos tidos como provados no acórdão recorrido, verifica-se que após a extinção das penas aí referidas (todas em pena de prisão inferior a 5 anos ou em pena de multa), em caso algum chegou a decorrer o prazo de 5 anos sem que, entretanto, não tivesse havido condenação pela prática de novo crime, sendo certo que, relativamente à pena de multa aplicada no Proc. 142/17.3..., do Juízo Pequena Criminalidade de ..., por decisão transitada em julgado no dia 21/10/2021, não existe, sequer, notícia da sua extinção.

E, portanto, como bem se assinala no Parecer do Exmº Procurador-Geral Adjunto, neste Supremo Tribunal, “facto é que as condenações consecutivas aí registadas, com intervalos de 1, 2 ou mesmo 5 anos, não implicariam a cessação da sua vigência – cf. artigo 11.º da Lei 37/2015, de 5–5 – e não poderiam ter–se por canceladas – mesmo quando não averbado esse cancelamento e como efeito ipso facto desde a extinção”.

Improcede, pois, esta pretensão do recorrente.

B) Deve ser reduzida a pena única aplicada ao arguido, ora recorrente?

Entende o recorrente que sim.

E isto porque, em seu entendimento,

“a pena máxima aplicável em sede de formulação do necessário cúmulo jurídico, não poderia exceder – e com o raciocínio deduzido anteriormente – 6 anos e nove meses de prisão. Por isso, numa formulação mecânica e material (não autorizada já ou não recomendada já pelo nosso Direito Penal), a soma aritmética das duas penas cumuláveis seria de 6 anos de prisão. Entende, por isso, o recorrente que o cúmulo a efectuar se deveria situar abaixo da pena aplicada, ou seja, não excedendo o patamar de 5 anos de prisão”.

Vejamos:

Salvo o devido e merecido respeito, o raciocínio do recorrente assenta em dois equívocos.

De um lado, porque parte do princípio – errado – de que o limite máximo da pena (única) aqui aplicável corresponde ao somatório das penas únicas aplicadas nos dois cúmulos já efectuados, nestes autos e no Proc. comum colectivo 291/15.1...

De outro, porque mesmo nesse raciocínio, o somatório das referidas penas alcança os 7 anos de prisão (e não os 6 anos, como refere).

Mas como é evidente e este Supremo Tribunal de Justiça já por várias vezes o afirmou, verificando-se a necessidade de proceder a um cúmulo jurídico de penas total ou parcialmente englobadas em cúmulos anteriores, elaborado novo cúmulo jurídico e, por isso, previamente “desfeito” os anteriores, as penas parcelares que os integravam retomam autonomia e, assim, os limites mínimo e máximo da pena única abstractamente aplicável são definidos pela pena parcelar mais elevada e pela soma de todas as penas parcelares, respectivamente 16.

E daí, portanto, que a pena única a aplicar, no caso em apreço, se deva procurar numa moldura abstracta que parte de um mínimo de 4 anos de prisão e encontra o seu máximo nos 9 anos e 9 meses de prisão.

Dentro desta moldura penal, o tribunal a quo entendeu por bem aplicar uma pena concreta de 6 anos e 9 meses de prisão, com a justificação que consta do excerto supra transcrito.

Posto isto:

“Quando alguém tiver praticado vários crimes antes de transitar em julgado a condenação por qualquer deles é condenado numa pena única. Na medida da pena são considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente” – artº 77º, nº 1 do Cod. Penal – sendo certo que a pena aplicável tem como limite máximo a soma das penas parcelares e como limite mínimo a mais elevada das penas concretamente aplicadas.

Assim sendo e como se disse, a moldura legal onde há-de ser encontrada a pena única resultante do cúmulo jurídico situa-se, no que respeita ao arguido e ora recorrente, entre um mínimo de 4 anos e um máximo de 9 anos e 9 meses de prisão.

Como bem se refere no Ac. deste STJ de 08-07-2020, Proc. n.º 1667/19.1T8VRL.S1 - 3.ª Secção, “I. A medida da pena conjunta deve definir-se entre um mínimo imprescindível à estabilização das expetativas comunitárias e um máximo consentido pela culpa do agente. II - Em sede de cúmulo jurídico a medida concreta da pena única do concurso de crimes dentro da moldura abstrata aplicável, constrói-se a partir das penas aplicadas aos diversos crimes e é determinada, tal como na concretização da medida das penas singulares, em função da culpa e da prevenção, mas agora levando em conta um critério específico: a consideração em conjunto dos factos e da personalidade do agente. III - À visão atomística inerente à determinação da medida das penas singulares, sucede uma visão de conjunto em que se consideram os factos na sua totalidade, como se de um facto global se tratasse, de modo a detetar a gravidade desse ilícito global, enquanto referida à personalidade unitária do agente. IV - De grande relevo será também a análise do efeito previsível da pena sobre o comportamento futuro do agente- exigências de prevenção especial de socialização”.

É que, como ensina Figueiredo Dias 17, na escolha da medida da pena única «tudo deve passar-se (…) como se o conjunto dos factos fornecesse a gravidade do ilícito global perpetrado, sendo decisiva para a sua avaliação a conexão e o tipo de conexão que entre os factos concorrentes se verifique. Na avaliação da personalidade – unitária – do agente relevará, sobretudo a questão de saber se o conjunto dos factos é reconduzível a uma tendência (ou eventualmente mesmo a uma ‘carreira’) criminosa, ou tão-só a uma pluriocasionalidade que não radica na personalidade: só no primeiro caso, já não no segundo, será cabido atribuir à pluralidade de crimes um efeito agravante dentro da moldura penal conjunta».

As penas em concurso respeitam a crimes nos quais está em causa um conjunto heterogéneo de valores, mas no qual é possível descortinar uma preocupante indiferença do recorrente pelo sofrimento e integridade física de terceiros (nestes autos, o recorrente foi condenado, entre o mais, pela prática de um crime de rapto, no âmbito do qual agrediu o ofendido “com chapadas e murros na cara”; no Proc. 291/15.1... foi condenado, entre o mais, pela prática de um crime de resistência e coacção sobre funcionário, no âmbito do qual “guinou bruscamente” o veículo automóvel que conduzia na direcção de um militar da GNR, por forma a escapar à operação de fiscalização policial em curso, tendo este procurado agarrar-se ao vidro da porta do condutor, que se partiu, sendo projectado para o chão, para o centro da faixa de rodagem).

E são, no caso e particularmente no que diz respeito aos crimes de rapto, extorsão e resistência e coacção sobre funcionário, elevadas as necessidades de prevenção geral, atento o sentimento de insegurança que as condutas respectivas geram na comunidade.

O arguido agiu, sempre, com dolo directo, sendo, por isso, elevado o grau de culpa.

Como elevado é o grau de ilicitude dos factos, traduzido no seu modo de execução (com particular relevância, naturalmente, para os factos que consubstanciaram a prática dos crimes de rapto, extorsão e resistência e coacção sobre funcionário).

De outro lado, sendo um facto evidente que entre a prática dos factos por cuja autoria o arguido foi julgado e condenado em ambos os processos mediaram mais de 6 anos, certo é igualmente que, como bem se refere no acórdão recorrido, o mesmo praticou, em 2005, 2006, 2008, 2009, 2010 e 2017, crimes por cuja autoria foi já julgado e condenado, sendo certo que desde 2017 se tem mantido em reclusão.

E, portanto, são aqui evidentes as necessidades de prevenção especial, tanto mais quanto é certo que em 28/10/2015, quando praticou os factos por cuja autoria foi julgado e condenado nestes autos, já o arguido havia cumprido uma pena de prisão, no âmbito do Proc. 253/08.6..., o que – como justamente se acentua no acórdão recorrido – “demonstra que a condenação anterior de prisão não surtiu suficiente efeito ressocializador, não tendo tal circunstância inibido o mesmo de delinquir novamente em 2015”.

A favor do arguido milita a sua juventude à data em que praticou os crimes por cuja autoria foi julgado e condenado no Proc. 291/15.1..., sendo que nessa altura o arguido ainda não havia sido condenado pela prática de qualquer crime (embora já tivesse praticado crimes por cuja autoria viria a ser julgado e condenado em momentos posteriores).

A seu favor milita, ainda, o seu actual bom comportamento prisional e o facto de estar motivado para, quando em liberdade “estar presente na vida dos dois filhos que possui”.

Em face de todo este circunstancialismo, entendeu o tribunal a quo – numa moldura penal que parte de um mínimo de 4 anos de prisão e atinge o seu máximo nos 9 anos e 9 meses de prisão, fixar a pena única em 6 anos e 9 meses.

Tal pena, como bem nota o Exmº Procurador-Geral Adjunto neste Supremo Tribunal de Justiça, tem ínsito um factor de compressão muito perto de ½, reflectindo “o pressuposto de que a personalidade do arguido é gravemente desconforme ao Direito, no sentido de demonstrar uma tendência criminosa, o que não ficou efetivamente demonstrado e dito”. E propõe, por isso, aquele Magistrado a aplicação de um factor de compressão mais próximo (pouco acima) de 1/3, isto é, uma pena concreta de 6 anos de prisão.

Ora,

No cúmulo inicialmente efectuado nestes autos, numa moldura penal que partia dos 4 anos de prisão e encontrava o seu máximo nos 6 anos e 3 meses, foi aplicada uma pena única de 4 anos e 6 meses. Dito de outro modo, foi utilizado um factor de compressão inferior a ¼.

No cúmulo inicialmente efectuado no Proc. 291/15.1..., a pena única aplicada correspondeu ao mínimo legalmente admissível. Isto é, cumuladas uma pena de 2 anos e 6 meses de prisão e uma outra de 12 meses de prisão, a 1ª instância havia aplicado uma pena única de 3 anos de prisão; em recurso, o Tribunal da Relação de Lisboa entendeu que o limite mínimo da pena aplicável ao concurso era a de 12 meses de prisão (e não, como devia, a de 2 anos e 6 meses de prisão) e, navegando nesse erro, reduziu a pena única de 3 anos de prisão para 2 anos e 6 meses de prisão 18.

Mesmo em face dos novos elementos trazidos ao conhecimento do tribunal a quo, através da leitura do CRC actualizado do arguido, dificilmente se compreende a subida de um factor de compressão inicialmente utilizado de ¼ para o actual ½.

Contudo, não determinada a referida tendência criminosa (como salientado pelo Exmº Procurador-Geral Adjunto, neste Supremo Tribunal), mas apurada – ainda assim – uma manifesta indiferença do recorrente pelo sofrimento e integridade física de terceiros, bem como uma prática criminosa que nem o cumprimento de uma pena efectiva de prisão impediu que fosse repetida, afigura-se-nos como evidente que, no caso, são prementes as exigências de prevenção especial.

E daí que a pena de 6 anos de prisão, proposta e sustentada no parecer elaborado ao abrigo do artº 416º, nº 1 do CPP, e situada pouco acima do 1º terço da pena abstractamente aplicável, se nos afigure mais adequada na situação em apreço, cumprindo de forma mais justa e equitativa as necessidades de prevenção geral e especial.

Justifica-se, pois e no sentido apontado, uma intervenção correctiva deste Supremo Tribunal, na pena única aplicada ao arguido, ora recorrente.

VII. Em face de tudo quanto exposto fica, acorda-se neste Supremo Tribunal em conceder parcial provimento ao recurso interposto pelo arguido AA, reduzindo a pena única fixada no acórdão recorrido para 6 (seis) anos de prisão, no mais confirmando o douto acórdão recorrido.

Sem custas.

Lisboa, 20 de Dezembro de 2023 (processado e revisto pelo relator)

Sénio Alves (relator)

Teresa de Almeida (1ª adjunta)

Pedro Branquinho Dias (2º adjunto)

____


1. Artigo 11.º Cancelamento definitivo

  1 - As decisões inscritas cessam a sua vigência no registo criminal nos seguintes prazos:

  a) Decisões que tenham aplicado pena de prisão ou medida de segurança, com ressalva dos prazos de cancelamento previstos na Lei n.º 113/2009, de 17 de setembro, com respeito aos crimes previstos no capítulo V do título I do livro II do Código Penal, decorridos 5, 7 ou 10 anos sobre a extinção da pena ou medida de segurança, se a sua duração tiver sido inferior a 5 anos, entre 5 e 8 anos ou superior a 8 anos, respetivamente, e desde que, entretanto, não tenha ocorrido nova condenação por crime de qualquer natureza;

  b) Decisões que tenham aplicado pena de multa principal a pessoa singular, com ressalva dos prazos de cancelamento previstos na Lei n.º 113/2009, de 17 de setembro, com respeito aos crimes previstos no capítulo V do título I do livro II do Código Penal, decorridos 5 anos sobre a extinção da pena e desde que, entretanto, não tenha ocorrido nova condenação por crime de qualquer natureza;

  c) Decisões que tenham aplicado pena de multa a pessoa coletiva ou entidade equiparada, com ressalva dos prazos de cancelamento previstos na Lei n.º 113/2009, de 17 de setembro, com respeito aos crimes previstos no capítulo V do título I do livro II do Código Penal, decorridos 5, 7 ou 10 anos sobre a extinção da pena, consoante a multa tenha sido fixada em menos de 600 dias, entre 600 e 900 dias ou em mais de 900 dias, respetivamente, e desde que, entretanto, não tenha ocorrido nova condenação por crime de qualquer natureza;

  d) Decisões que tenham aplicado pena de dissolução a pessoa coletiva ou entidade equiparada, decorridos 10 anos sobre o trânsito em julgado;

  e) Decisões que tenham aplicado pena substitutiva da pena principal, com ressalva daquelas que respeitem aos crimes previstos no capítulo V do título I do livro II do Código Penal, decorridos 5 anos sobre a extinção da pena e desde que, entretanto, não tenha ocorrido nova condenação por crime de qualquer natureza;

  f) Decisões de dispensa de pena ou que apliquem pena de admoestação, decorridos 5 anos sobre o trânsito em julgado ou sobre a execução, respetivamente;

  g) Decisões que tenham aplicado pena acessória, após o decurso do prazo para esta fixado na respetiva sentença condenatória ou, tratando-se de pena acessória sem prazo, após a decisão de reabilitação.

2 - Quando a decisão tenha aplicado pena principal e pena acessória, os prazos previstos no número anterior contam-se a partir da extinção da pena de maior duração.

3 - Tratando-se de decisões que tenham aplicado pena de prisão suspensa na sua execução os prazos previstos na alínea e) do n.º 1 contam-se, uma vez ocorrida a respetiva extinção, do termo do período da suspensão.

4 - Cessam também a sua vigência no registo criminal:

  a) As decisões que sejam consequência, complemento ou execução de decisões cuja vigência haja cessado nos termos do n.º 1;

  b) As decisões respeitantes a pessoa singular, após o seu falecimento;

  c) As decisões respeitantes a pessoa coletiva ou entidade equiparada, após a sua extinção, exceto quando esta tenha resultado de fusão ou cisão, caso em que as decisões passam a integrar o registo criminal das pessoas coletivas ou equiparadas que tiverem resultado da cisão ou em que a fusão se tiver efetivado;

  d) As decisões consideradas sem efeito por disposição legal.

5 - A cessação da vigência das decisões não aproveita ao condenado quanto às perdas definitivas que lhe resultarem da condenação, não prejudica os direitos que desta advierem para o ofendido ou para terceiros nem sana, por si só, a nulidade dos atos praticados pelo condenado durante a incapacidade.

6 - As decisões cuja vigência haja cessado são mantidas em ficheiro informático próprio durante um período máximo de 3 anos, o qual apenas pode ser acedido pelos serviços de identificação criminal para efeito de reposição de registo indevidamente cancelado ou retirado, e findo aquele prazo máximo são canceladas de forma irrevogável.↩︎

2. Cuja inexistência nos autos se pode reconduzir ao vício da insuficiência para a decisão da matéria de facto provada (assim, acórdão do TRG, de 22–11–2010, processo n.º 35/10.5GDVCT–G1) ou, segundo outros, a não apreciação da totalidade dos antecedentes reconduz–se a omissão de pronúncia (assim, acórdão do TRP, de 11–1–2023, processo n.º 111/22.1PTAVR.P1.↩︎

3. A jurisprudência deste tribunal segue a formulação avançada pelo Professor Figueiredo Dia, in “Direito Penal Português - As Consequências Jurídicas do Crime”, Aequitas, Editorial Notícias, 1993, pp. 290 e ss., que invoca recorrentemente.↩︎

4. Cf. Anotação 3., ao artigo 77.º do Código Penal, in Comentário do Código Penal. Lisboa: Universidade Católica Editora, 2008, p.244.↩︎

5. Acolhido numa formulação algo híbrida e prudencial, no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 20-03-2014, no processo n.º 273/07.8PCGDM.S1, relator Santos Cabral, de que se citam as seguintes passagens: “[…] Após sintetizar as posições em confronto Lourenço Martins encontra algum conforto na tese do recurso à complementaridade, mas suportando esta em algo de mais substancial do ponto de vista dogmático do que a mera necessidade em igualização de penas em termos de obediência ao princípio da igualdade. Defende o mesmo a «adição de uma proporção do remanescente das penas parcelares que oscila, conforme as circunstâncias de facto e a personalidade do agente e por via de regra, entre 1/3 e 1/5 e acrescenta que se bem que a corrente, que se poderia designar do «fator percentual de compressão», possa relutar a um Julgador cioso do poder discricionário (aqui, aliás, mais vinculado que discricionário), desde que o seu uso não se faça como ponto de partida mas como aferidor ou mecanismo de controlo, não nos parece que deva, sem mais, ser rejeitada. Ela representa um esforço de racionalização num caminho eriçado de espinhos, desde que afastada uma qualquer «arbitrariedade matemática» ou uma menor exigência de reflexão sobre os dados. O direito, como ciência prática e não especulativa nunca atingirá a certeza das matemáticas ou das ciências da natureza, mas a jurisprudência deve abrir-se ao permanente aperfeiçoamento.

  Colocada, assim, a questão, e repetindo a nossa posição de princípio da não aceitação de quaisquer critérios matemáticos alheios duma valoração normativa, não repugna que a convocação dos critérios de determinação da pena conjunta tenha como coadjuvante, e não mais do que isso, a definição dum espaço dentro do qual as mesmas funcionam.

  Na verdade, a certeza e segurança jurídica podem estar em causa quando existe uma grande margem de amplitude na pena a aplicar, conduzindo a uma indeterminação. Recorrendo ao princípio da proporcionalidade não se pode aplicar uma pena maior do que aquela que merece a gravidade da conduta nem a que é exigida para tutela do bem jurídico.

  Assim,

  Para evitar aquela vacuidade admite-se o apelo a que, na formulação da pena conjunta e na ponderação da imagem global dos crimes imputados e da personalidade, se considere que, conforme uma personalidade mais, ou menos, gravemente desconforme com o Direito, o tribunal determine a pena única somando à pena concreta mais grave entre metade e um quinto de cada uma das penas concretas aplicadas aos outros crimes em concurso (Confrontar Juiz Conselheiro Carmona da Mota em intervenção no STJ no dia 3 de Junho de 2009 no colóquio subordinado ao tema "Direito Penal e Processo Penal", igualmente Paulo Pinto de Albuquerque Comentários ao Código Penal anotação ao artigo 77). […]”.

6. Vide, entre muitos, o acórdão do STJ de 18.01.2012, disponível para consulta in www.dgsi.pt.

7. Disponível em www.dgsi.pt.

8. Acresce que a grande maioria dessas penas encontram-se extintas por pagamento da pena de multa ou por ter decorrido o período da suspensão (art. 57.º do CP).

9. Sendo que possui outras condenações como roubo e crime sexual.

10. Também possui condenação por crime de furto qualificado.↩︎

11. Também possui condenações por crime de detenção de arma proibida.

12. Também possui condenação por condução perigosa de veiculo rodoviário.

13. Ac. STJ de 13/1/2022, Proc. 2427/19.5PSLSB.L1.S1, acessível em www.dgsi.pt.

14. Também acessível no mesmo sítio.

15. Cfr., neste sentido, o Ac. STJ de 16/6/2016, Proc. 2137/15.2T8EVR.S1, acessível em www.dgsi.pt.: “A questão de apurar da justeza, proporcionalidade e adequação da concreta medida da pena única fixada no acórdão recorrido, passa a ser objecto do recurso, constituindo um prius, a indagação da necessidade e mesmo da legalidade de proceder a tal cúmulo jurídico nos exactos moldes em que o foi”.

16. Neste sentido e entre vários outros, cfr. os Acs. STJ de 16/3/2022 e de 29/3/2023, Procs. 507/19.6PBEVR.E1.S1 e 3478/22.8T8CBR.S1, respectivamente, ambos com o mesmo relator do presente acórdão, acessíveis em www.dgsi.pt.

17. Direito Penal Português, As Consequências Jurídicas do Crime, 291.

18. Como se constata da leitura do acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 15/6/2016, junto aos autos a coberto da ref. 11751388, esse Tribunal, após considerar justas e adequadas as penas parcelares aplicadas na 1ª instância, de 12 meses e de 2 anos e 6 meses, mantendo-as, assim decidiu: “Por fim, entende-se que em sede do cúmulo jurídico das duas penas parcelares de prisão e dentro da moldura legal e abstracta a considerar, que varia entre um limite mínimo de 1 ano (12 meses) e um máximo de 3 anos e 6 meses de prisão (artº 77º/ 1 e 2 do C.P.), a pena única de 3 (três) anos de prisão se revela um pouco acima da medida que se considera justa e adequada (…). Tudo ponderado, entende este Tribunal ser adequada a imposição ao arguido de uma pena única de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão” (subl. nosso).